Na última sexta-feira de maio, 31, a Secretaria Nacional de Mulheres realizou a segunda reunião virtual para debater a Autorreforma e as mulheres socialistas. Com quase três horas de debates, as participantes puderam debater as teses da Autorreforma. Participaram as secretárias estaduais Luciana Cruz, da Bahia; Norma Zélia, do Ceará; Glauce Cordeiro, do Maranhão; Niedja Guimarães, de Pernambuco; Silvana Castro, do Piauí; e Tatiana Pires, do Rio Grande Do Norte. Participaram como convidadas a deputada federal, Lídice da Mata (PSB-BA) e a doutora em Sociologia, Cristina Buarque. A secretária nacional de mulheres, Dora Pires, foi a mediadora.
Após Dora explicar a dinâmica da reunião e cada secretária estadual ter feito sua saudação, a deputada federal iniciou sua explanação. Inicialmente, Lídice destacou que o PSB tem um desafio duplo: “promover a organização das mulheres enquanto militantes e despertar na sociedade e nas mulheres a consciência da discriminação de gênero. A consciência da superação dessa discriminação e, ao mesmo tempo, da superação do capitalismo, é fundamental. Também fazer a tarefa imediata no estágio político que nos encontramos da luta pelo voto. Porque os partidos se organizam, também, para lutarem pelo voto na sociedade. É fundamental que preparem nossas militantes para atuarem, portanto, na condição até, se necessário e desejarem, de candidatas seja nos municípios, estados”.
Em seguida, partiu para a análise de algumas teses do capítulo Mais Mulheres no Poder. “No artigo 370, sugiro uma emenda no texto ‘O capitalismo ao longo do século’ que separa os grupos desigualmente, destacando a super exploração de negros e mulheres. A desigualdade é negra, pois os negros são maioria no Brasil. A emenda precisa incluir também os idosos vulneráveis, crianças, adolescentes e pessoas com deficiência. Pois sem estas classes incluídas, o texto fica incompleto.”, defendeu a parlamentar.
Sobre o artigo 381, sugeriu uma emenda, pois nele se fala da garantia da autonomia da mulher afastando dos ambientes de dependência: “o PSB defende firmemente as creches públicas como instrumento de emancipação. Não é suficiente, pois quando defendemos a creche como instrumento de emancipação, não alargamos a compreensão de que não basta só isso, precisamos rediscutir a divisão social do trabalho entre homens e mulheres. Não é uma responsabilidade só das mulheres, o homem também tem participação. É claro que com o ambiente social que vivemos e a discriminação que a mulher sofre com a carga de trabalho doméstico e do cuidado com a família, a creche surge como ajuda, mas não basta o socialista lutar somente por isso. Tem que ser uma luta igual. Homens têm que dividir tarefas e precisa haver a divisão social. Se a dependência da mulher continuar não teremos igualdade. Muitas mulheres cuidam de idosos, se aposentam mais cedo para cuidar de uma mãe, um pai idoso mesmo que na família tenham outros irmãos. Apenas a mulher faz sacrifício para cuidar da família, é preciso uma redivisão.”, afirmou.
Acerca do tema saúde da mulher, a presidente do PSB-BA alertou que há pouco conteúdo sobre: “é uma questão essencial, colocamos a defesa do aborto legal, mas não incluimos o contexto anterior de prevenção da saude da mulher. Isso cabe como política pública dos governos que estamos à frente. Garantir acesso e atenção integral com políticas de acesso ao pré-natal e exames preventivos de câncer de mama e útero, que são dois tipos que mais matam, temos que pensar na mulher.”
Economia e poder político
Ainda durante sua fala, a deputada abordou a área da economia, setor tão afetado com a pandemia e com o desgorverno atual. “Sobre a economia, temos a questão da preparação das mulheres, a qualificação do trabalho e programas de emprego de rendas para chefes de família. Creio que não deve ser só para chefes de família, jovens também precisam se qualificar, com educação de qualidade garantida, educação tecnológica e as frentes de trabalho de forte política de empregabilidade em geral. No Brasil, hoje, mais de 43% de mulheres são chefes de família, o peso na economia é real, somos maiorias também na informalidade e idosas. É necessário pensar na política pública de forma mais integral”.
A questão da mulher idosa também foi falada pela parlamentar. Segundo ela, é preciso acabar com a ideia de que uma uma mulher de 60 anos de idade não tem mais capacidade de produção, “pelo contrário procuram uma renda extra após se aposentar”, disse. “Os idosos estão passando por um empobrecimento grave, isso poderia estar na tese, os idosos e aposentados estão empobrecendo, como foi no Chile com a reforma da previdência de Pinochet e como está acontecendo no Brasil. A capacidade de compra, consumo e sobrevivência vem caindo pelas políticas neoliberais da economia e os idosos são por maioria mulheres. É preciso pensar em uma políticas públicas para inclusão produtiva forte para as mulheres, raíz de grande discriminação.”, defendeu.
“Quando se trata de poder político, estamos lutando por cotas de 30% temos que lutar por paridade no poder político interno do partido de 50% de paridade da nossa participação. Se nós vamos conseguir isso ou não, é outra coisa. Se na Câmara dos Deputados nós lutamos por isso, porque no congresso interno do partido nós vamos lutar por menos? Nós queremos isso! Queremos a paridade de participação política nas estruturas do poder do partido, assim como queremos a paridade da participação política do poder na sociedade. Qual o processo de paridade? Isso foi discutido hoje (28/05) no seminário, em alguns países, na própria América Latina não discutimos mais a política de cota, discutimos a paridade no parlamento, algo que começamos a discutir agora no Brasil.”, informou.
Por fim, Lídice ressaltou que não se pode pensar em democracia sem entender que formam 52% da população e 53% de eleitores no Brasil, respectivamente. “As mulheres não estão prevendo a garantia de participação igualitária na estrutura de poder deste país. Temos que conquistar isso e não em 100 anos como foi na Suécia, mas em muito menos tempos, pois as mulheres têm pressa de alcançar essa circunstância porque se nós não alçarmos a possibilidade de estar no parlamento com 50% com o olhar das mulheres, não alcançaremos políticas públicas de inclusão. O que está provado no Brasil é que crescemos os direitos das mulher assim que crescemos a participação da mulher no parlamento, temos uma constituição cidadã porque alcançamos 26 mulheres naquele patamar e 1988 que foi uma conquista inédita de participação das mulheres no poder políticos e conquistamos a Lei Maria da Penha porque tínhamos e crescemos o número de mulheres ou será que algum homem ia poder pensar em uma política de combate à violência doméstica do Brasil? Não! Essas políticas nascem da militância, da vivência da consciência, da observação da vida que só as mulheres podem pensar nela”, encerrou.
Em seguida foi a vez da apresentação da doutora em sociologia Cristina Buarque, que começou a apresentação fazendo um resgate histórico do patriarcado no Brasil que, para ela, não é como em outros lugares do mundo, que surgiu de uma evolução. “O patriarcado no Brasil foi trazido pelos portugueses e posto aqui para formar esse Brasil, República, Império, colônia. É parte da nossa estrutura, introjetada em nós e em todas as pessoas, como se livrar disso é uma questão para os partidos também. O patriarcado nos estrutura”, relatou.
Segundo a socióloga, para falar sobre as análises das teses é necessário fazer um resgate histórico do surgimento do Brasil a partir da perspectiva europeia. “O capitalismo também tem essa estrutura patriarcal, racista e capitalista onde ele aparece como garantidor da exploração absoluta da natureza com base nas ideias de infinitude dos recursos naturais e a necessidade da competitividade em todos os campos das relações humanas para que gere bens de serviço. Estamos vivendo, hoje, essa crise emocional que é a volta desse patriarcado completamente incorporado pela governança federal que nós temos hoje. O patriarcado é a virilidade, força, violência, o desrespeito às mulheres, aos negros, à sexualidade. Precisamos ter uma clareza do que acontece hoje, ou seja, da forma que estão funcionando hoje que pede para a gente não por gênero nos planos de educação, pede não, uma delicadeza da minha parte, para não me humilhar, dizer que me obriga , para não ter gênero, uma discussão de gênero, que discussão dessa construção dessa masculinidade viril, violenta, que estupra, que faz isso e aquilo para se sentir dono do governo?”, questionou.
Analisando as teses, a convidada fez observação quanto à 372, que versa sobre a lei 9.504/97, que determina 30% de vagas por sexo. “É muito pouco, não dá mais. Desde 1997 não mudou e estamos quase em 2027, e continua a mesma coisa, essa coisa tem que ser melhor tratada por nós aqui.O artigo 372, que fala da igualdade de condições e mais mulheres no poder , ora como podemos fazer mais mulher no poder?”, observou.
Por fim, Cristina Buarque afirmou ser preciso construir algo “mais concreto, para colocar essa ideia de mais mulheres no poder, tem que dizer como é que faz mais mulheres no poder. Esse texto todinho não me disse em nenhum lugar como. É preciso trazer isso. Uma questão que deve ser trazida para isso, uma resposta e uma pergunta. Qual a possibilidade do PSB trabalhar a democracia representativa e a democracia participativa de uma forma equilibrada e respeitosa com os movimentos sociais? Não basta dizer que eu tenho segmentos, eu preciso que esses segmentos realmente existam para mim. Esse é um ponto fundamental porque o PSB precisa ter consciência histórica de que as mulheres foram sempre excluídas da representação e, que quando deu 26 mulheres na Constituinte, foi uma coisa maravilhosa. Minha geração toda ficou feliz e daqui a pouco vai ser 30, 40, 100. Mas não aconteceu, somos ainda 15%. É preciso dizer como”, encerrou.
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