Em entrevista concedida à Agência Câmara, a deputada federal Sandra Rosado (PSB-RN) afirmou que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a exploração do trabalho infantil no País deve ser oficialmente instalada já nos próximos dias. Rosado, que é autora do requerimento da CPI, diz conhecer de perto a realidade de famílias pobres que são levadas a colocar seus filhos no trabalho de lavoura e carvoeiras no Nordeste. “A pobreza é muito grande, mas o pior é a desinformação. Eu sei porque vejo, não li apenas em nenhum lugar, a criança na escola traz mais futuro para essas famílias do que se ausentando para trabalhar”, disse. Desde 2006, a deputada vem apresentando o requerimento para criação da CPI, e finalmente ela se concretizou. Agora a instalação depende das indicações de integrantes pelos líderes de todos os partidos. Mas a deputada acredita que os deputados já estão interessados em participar dos trabalhos e que as indicações partidárias não devem demorar. “Já demorou muito, mas esse é um dos problemas mais sérios que temos de resolver no Brasil”, disse. Dados oficiais mostram que, em 2011, 3,7 milhões de crianças e adolescentes de cinco a dezessete anos trabalharam no Brasil em atividades econômicas ilegais. APRENDIZES — No Brasil o trabalho é proibido antes dos 14 anos, e só pode ser feito em meio período até os 17 anos, com os adolescentes contratados como aprendizes. Embora os números tenham melhorado muito entre 2001 e 2008, o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPeti) alerta para o fato de que pouco foi alterado de 2008 até hoje. A campanha “Tem criança que nunca pode ser criança” denunciou o problema que mais tem preocupado especialistas: o trabalho Infantil doméstico. Dos 3,7 milhões de crianças que estão em situação de exploração, 57,5%, ou seja, 2,1 milhões trabalham em serviços domésticos, como lavar, passar roupa e cuidar dos irmãos. CONFERÊNCIA— Em outubro, o Brasil vai sediar a III Conferência Global sobre Trabalho Infantil, promovida pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). Pelos dados da instituição, 10,5 milhões de crianças em todo o mundo são trabalhadores domésticos em casas de outras pessoas, em alguns casos em condições perigosas e análogas à escravidão. Desde 1996, o Brasil tem um Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti). Hoje ele está integrado ao Bolsa Família, e famílias com crianças que são encontradas trabalhando têm prioridade de inscrição no programa. Além da transferência de renda, o programa prevê o acompanhamento das famílias e dos alunos para recuperar o tempo gasto no trabalho e ajudar no retorno à escola, ou à maior dedicação aos estudos.
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Agência Câmara– A legislação é muito tênue na questão do trabalho infantil? Sandra Rosado– Não apenas é tênue, mas a legislação também é pouco conhecida. E as pessoas se valem da impunidade, que permeia o setor de exploração do trabalho infantil. Isso faz com que haja um afrouxamento da legislação, e as pessoas se utilizam desse trabalho como se fosse a coisa mais natural do mundo, mas não é. Agência Câmara – E como lidar com as famílias que estão em programas de agricultura familiar? Sandra Rosado– Há um enraizamento cultural muito forte da ideia de que a criança precisa trabalhar na agricultura familiar, mas isso está errado. O que precisamos mostrar para as famílias e os educadores é que essa criança não pode ser usada desde cedo como força de trabalho, mas pode ser aproveitada na forma de aprendizado, se preparando para ser um técnico, por exemplo, e melhorar a realidade de sua família. Essas crianças na escola garantem uma perspectiva muito melhor para as famílias do que se ausentando da escola. Agência Câmara – A CPI vai investigar se o Peti ainda está dando resultados? Sandra Rosado– Esse programa é muito importante, mas ainda não alcançou a sua plenitude. Esse resíduo que existe é forte, com um número elevado de crianças que estão sendo exploradas. É preciso estudar o problema e mostrar onde estão essas crianças, para que o Peti chegue a regiões marginalizadas do Norte e Nordeste, onde existem milhares de crianças no corte da lavoura, por exemplo. Agência Câmara – O que a CPI pode fazer para resolver o problema? Sandra Rosado– Vamos sugerir alterações da legislação, claro, mas o principal trabalho, pelo menos no início, deve ser o diagnóstico, saber onde estão e por quê estão no trabalho essas crianças. Vamos levantar os dados, visitar os locais e podemos intimar as pessoas para conversar sobre as soluções e depor sobre abusos.
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Fonte: Agência Câmara
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