Apesar do avanço das cubanas no mundo do conhecimento, no qual representam 64% dos graduados nas universidades, a presença e o status feminino seguem limitados na direção de empresas. “Ainda há muitas barreiras para nós na hora de ter acesso a postos de direção”, explicou à IPS a chefe do departamento jurídico do Grupo Empresarial da Construção de Havana (estatal), Mirtha Reina Reyes. Esta advogada de 44 anos começou em seu atual emprego em 2008, buscando um lugar mais perto de sua casa para cuidar de seu filho mais novo, com Síndrome de Down. “Nunca imaginei que pudesse incursionar neste setor”, confessou Reyes, que antes trabalhara em um tribunal. “O que mais atenta contra a mulher é o alto custo que implica estar em cargo de direção”, acrescentou. Para ela, esta situação vivida por todas as mulheres se deve ao fato de “estarem muito ligadas ao trabalho doméstico, embora não tenham filhos nem idosos para cuidar”. As jornadas de trabalho entendidas (além das oito horas e também em finais de semana), a necessidade de traçar estratégias para serem respeitadas como dirigentes e a sobrecarga doméstica figuram entre os principais obstáculos identificados pelas chefes de empresas estudadas pela psicóloga Dalia Virgilí. Esta é uma das poucas pesquisadoras que aplica o enfoque de gênero na inexplorada área empresarial cubana, composta atualmente por 2.250 entidades, todas de caráter estatal, segundo dados de 2012 fornecidos pelo Escritório Nacional de Estatísticas e Informação (Onei). “Existem grandes desigualdades entre homens e mulheres no espaço empresarial, tanto nos níveis de direção, como em todas as estruturas”, pontuou Virgilí em conversa exclusiva com a IPS. “Elas pagam mais custos, enfrentam conflitos por serem mulheres e são obrigadas a traçar estratégias para continuar no cargo. Este é um espaço desejado por todos”, destacou. A seu ver, quando as mulheres obtiveram grandes avanços nos espaços acadêmico e de pesquisas, os nichos de poder se trasladaram para o âmbito empresarial, um motor fundamental das economias na atualidade. As empresas, sobretudo as de produção e turismo, figuram entre as melhores opções de emprego dentro da deprimida economia da ilha. As trabalhadoras, e os trabalhadores, que culminaram ou transitaram pelo chamado “aperfeiçoamento empresarial”, recebem pagamento por resultados e maiores estímulos salariais de entidades deste tipo. Esse programa de mudanças, aplicado desde a década passada em busca de maior produtividade, autonomia e eficiência, foi revisto na atual reforma econômica, que se centrará daqui em diante em impulsionar a empresa, segundo se percebeu esta semana com a transmissão de trechos da última reunião parlamentar. Apesar das limitações que enfrentam, as cinco empresas nesse processo de transformação no município especial Ilha da Juventude, a segunda maior ilhota do arquipélago cubano, alcançaram em 2011 uma produtividade que permitiu pagar remunerações mensais superiores a 550 pesos cubanos (cerca de US$ 22). No mesmo ano, o salário médio mensal no país foi de 455 pesos, um indicador que aumentou ligeiramente ao final de 2012, quando chegou a 466 pesos, em média, segundo o último informe da Onei. As remunerações maiores são pagas no setor da construção. Embora Cuba estipule salários iguais para homens e mulheres, ativistas e especialistas alertam que elas costumam receber remuneração um pouco menor na prática, porque faltam mais ao trabalho para atender as necessidades dos filhos e de idosos aos seus cuidados. Também têm menos acesso a postos de salários altos. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) relatou uma diminuição, entre 2008 e 2011, na brecha salarial de gênero nos países com dados disponíveis, entre os quais não figurou Cuba. Porém, esclareceu que nem sempre essa redução foi causada por uma melhoria salarial das mulheres, mas pela deterioração do salário dos homens devido à crise global. “A incorporação das cubanas em cargos de direção das empresas as empodera economicamente e, por fim, as famílias”, observou Virgilí. Esta especialista afirmou que hoje “não se aproveita nesse setor o potencial das mulheres, que se formam nas universidades com melhores qualificações do que seus colegas homens”. Entretanto, a psicóloga insistiu que estas organizações devem mudar seu funcionamento para conseguir a plena incorporação feminina. “Encontramos mulheres com crise de identidade, pois sentem que devem se converter em homens para dirigir, e com sérias dificuldades para conciliar trabalho e casa”, acrescentou Virgilí. Estilos de direção menos masculinizadas, a sanção da jornada de trabalho estendida, promover que elas assumam postos de direção, capacitação em gênero e realização de atividades recreativas para o pessoal que incluam as famílias fazem parte das transformações institucionais propostas pela psicóloga. Virgilí também afirmou que são necessárias mais mudanças em favor da igualdade de gênero nas famílias, avançar na mudança da mentalidade machista e garantir melhores serviços nos cuidados a crianças e idosos, entre outros. Mas, nem todas as histórias de mulheres dirigentes repetem este panorama. Consuelo Díaz, executiva com ampla trajetória na indústria do petróleo, contou à IPS que viveu “alguns momentos” de discriminação quando começou sua carreira empresarial. “Depois, o dia a dia do trabalho realizado com critério próprio e firmeza, sem perder a sensibilidade nem o respeito, me deu fatores importantes de sucesso”, recordou esta economista. “Sou muito exigente com a qualidade do trabalho, e nunca permiti maus-tratos nem grosseria. Jamais usei uma palavra obscena para me dirigir aos trabalhadores”, ressaltou Consuelo, que trabalhou quase 30 anos em diversos postos de direção em uma unidade de gás liquefeito, onde a maioria dos funcionários era de homens. |
Fonte: Envolverde/IPS
|