*Por Aline Valek
É possível combater o machismo com simples ações cotidianas – e isso é fundamental para transformar a nossa sociedade
Que as ideias feministas estão ficando cada vez mais populares, disso não há dúvidas. O choro e ranger de dentes de algumas pessoas inconformadas com o empoderamento das mulheres talvez seja um dos mais evidentes indícios da popularização do feminismo. Mas isso não significa que as coisas estejam bem e que nada mais precise ser mudado; pelo contrário: ainda há muito a ser feito.
Para isso, é preciso fazer mais do que ficar no campo das ideias. Tomar consciência do machismo e apontar onde ele se manifesta na nossa cultura é importantíssimo e sempre válido, mas também é possível combatê-lo com ações práticas no nosso cotidiano. E algumas delas são tão simples que muita gente já deve praticá-las mesmo sem saber. Claro que nem sempre vai ser fácil mudar de atitude, mas o poder transformador disso compensa o trabalho.
Neste post proponho um chamado, listando ALGUMAS das atitudes práticas (aposto que você consegue pensar em outras) que qualquer pessoa pode adotar no seu dia a dia, para que juntos possamos desconstruir essa sociedade machista e construir, no lugar, uma sociedade com mais igualdade e empatia. E aí, vamos nessa?
Ser gentil com qualquer pessoa, independente do gênero, da cor, da idade – diferente do cavalheirismo, em que só o homem faz algo para uma mulher, a gentileza não tem gênero. O cavalheirismo é só outro nome para uma atitude paternalista, que pressupõe que a mulher é incapaz e que precisa de um homem para abrir a porta, para carregar uma sacola pesada ou coisa do tipo. Já ser gentil significa que você vai segurar a porta independente de quem estiver entrando depois de você, seja uma mulher, uma senhora, o porteiro, uma criança ou um lutador de vale-tudo. Enquanto só um homem pode ser cavalheiro, tanto homens quanto mulheres podem ser gentis. Ou seja: a gentileza pode ser praticada por qualquer pessoa em favor de qualquer pessoa. Ser gentil também significa que você vai fazer algo bom para as pessoas sem esperar nada em troca, muito menos uma chuva de confetes. Afinal, ser gentil e ter empatia é o requisito mínimo para um ser humano decente.
Dividir as tarefas em casa – todas as pessoas que vivem numa casa devem ter a responsabilidade de cuidar dos afazeres domésticos. Não preciso nem dizer o quanto é machista achar que o dever de fazer essas coisas seja somente da mulher, né? Lavar a louça, varrer a sala ou estender a roupa no varal não é uma “ajuda”, mas sim sua obrigação. Da mesma forma que você não deve ser gentil esperando algo em troca, não dá para achar que você merece uma medalha simplesmente por fazer o básico que qualquer adulto independente deve fazer: cozinhar a própria comida, lavar a própria roupa, arrumar a própria casa. Além disso, dividir igualmente as tarefas domésticas torna mais fácil e mais rápido manter a casa arrumada e limpa. Experimenta só!
Apoiar outras mulheres – é muito fácil se tornar inimiga da outra, afinal, somos ensinadas a sempre rivalizar com outras mulheres. Mas toda vez que você apoia uma mulher, se solidariza com ela, elogia o seu trabalho, mostra que ela pode contar com você ou mesmo quando fazem algo juntas, um pedacinho desse mito de que mulheres são inimigas, traiçoeiras e invejosas se quebra. É importante começarmos a pensar em outras mulheres como nossas aliadas. Você samba na cara do machismo e ainda pode ganhar uma grande amiga de bônus.
Permitir que crianças descubram suas habilidades independente de papéis de gênero – quando dizemos que “menino não pode isso” ou que “menina não pode aquilo” estamos, desde cedo, limitando os potenciais das pessoas. Por que em vez de ensinar papéis de gêneros caducos e limitadores, não ajudamos as crianças a desenvolverem suas habilidades e se tornarem seres humanos melhores? Por exemplo: incentivar uma garota apaixonada por artes marciais a praticar esportes de luta, por mais que seja considerado “coisa de menino”, pode ajudar a criar uma futura atleta. Permitir que um garoto brinque com boneca, algo que é visto como “coisa de menina”, pode ajudar a criar no futuro um pai afetuoso.
Denunciar violência – toda vez que um agressor fica impune, permite-se que a violência continue acontecendo e que outras mulheres sejam vítimas. É preciso mostrar que agressão, assédio, abuso e outras formas de violência NÃO SÃO aceitáveis. E a melhor forma de fazer isso é garantir que o agressor seja responsabilizado pelos seus atos, denunciando. Quando é algo que você presenciou, é mais delicado e em muitas circunstâncias algo muito difícil, mas apoiar a vítima e incentivá-la a fazer a denúncia é uma forma de não se omitir diante da violência.
Não ser cúmplice – você pode combater o machismo fazendo várias coisas, mas também pode combater NÃO fazendo outras. Não passar adiante imagens íntimas de mulheres que vazaram contra o consentimento delas, por exemplo (e denunciar quem esteja fazendo isso, vide tópico anterior). Não assediar mulheres na rua. Não julgar a sexualidade de uma mulher (porque também não é da sua conta). Não compartilhar mensagens de ódio à mulher, ou com conteúdo racista, homofóbico, transfóbico, gordofóbico (e denunciar, se possível). Esses são só alguns exemplos, mas o mundo está cheinho de coisas machistas que você pode e deve se recusar a ser cúmplice.
Não é preciso militar no feminismo para fazer nenhuma dessas coisas. Basta ter vontade de mudar as coisas – e a melhor forma de começar a fazer isso é mudando a si mesmo. Trabalho de formiguinha acabar com o machismo? Com certeza. Mas quando for arregaçar as mangas para fazer a sua parte, lembre-se de que formigas, apesar do tamanho, são assustadoramente fortes.
*Aline Valek é blogueira do Escritório Feminista
Fonte: Carta Maior