Neste blog, muitas vezes procuramos discutir o conceito de gênero em textos contidos principalmente na categoria “Conceituando”. Gênero é um termo que, além de dar nome ao nosso blog, é absolutamente importante para o feminismo. Da mesma forma, é fruto de disputas políticas e teóricas, sendo que sua conceituação demanda, necessariamente, a escolha de certos referenciais. Não se trabalha, jamais, com uma definição de gênero. Dado que uma das propostas dessa página é apresentar questões acadêmicas e militantes de forma clara, mas sempre embasada, para o público mais diverso que possamos encontrar, neste texto inicio uma série de seis artigos que versarão sobre o conceito de gênero, baseados, cada um, na conceituação de cinco importantes autoras e um autor, os quais versaram (e a maioria ainda versa) sobre o feminismo. A seguir, uma apresentação bem resumida de cada uma dessas autoras escolhidas. Não tenho pretensão nenhuma de esgotar seus pensamentos, mas apenas de trazer algumas de suas contribuições para pensar gênero. Em todos os casos, usarei textos originais de cada autor (o que significa que apresento uma leitura pessoal), com adendos de outras autoras que também se debruçaram neles, dentre Marília Carvalho (2011), Adriana Piscitelli (2002), Donna Haraway (2004) e Carlos Eduardo Henning (2008). (Clique nos nomes das autoras abaixo para acessar o seu respectivo texto.) Gayle Rubin, o pontapé inicial de gênero no feminismo Em 1975, a antropóloga norte-americana Gayle Rubin publica um capítulo que se tornou uma referência obrigatória. Enquanto estudante de pós-graduação, Rubin apresentou uma conceituação que, a partir do seu texto, passou a ser utilizada largamente por autoras feministas. Embora seu texto discuta principalmente o pensamento de Lévi-Strauss e Freud – sem falar em uma breve crítica ao marxismo –, Rubin fez história ao descrever o que ficou conhecido como sistema sexo/gênero, ainda influente nos dias atuais, mesmo disputando espaço com outras concepções distintas. Joan Scott, uma leitura pós-estruturalista No fim da década de 1980, outro artigo se torna clássico. A historiadora estadunidense Joan Scott, influenciada pelas correntes pós-estruturalistas que se inspiraram no pensamento de Foucault e Derrida, esquematizou uma nova forma de se pensar gênero, a partir de uma crítica a outras concepções, inclusive a do sexo/gênero, que, em sua opinião, eram incapazes de historicizar a categoria sexo e o corpo. Assim, Scott reforça uma utilidade analítica para o conceito de gênero, para além de um mero instrumento descritivo, e chama a atenção para a necessidade de se pensar na linguagem, nos símbolos, nas instituições e sair do pensamento dual que recai no binômio homem/mulher, masculino/feminino. Judith Butler, rumo à teoria queer Em meados de 1980-90, a filósofa norte-americana Judith Butler – uma das autoras mais badaladas da atualidade, inspiradora da vertente queer – se debruça em uma crítica ao feminismo, balançando uma série de categorias a princípio tão sólidas, tais como mulher e identidade. Butler expõe a ordem que prevê total coerência entre o sexo, gênero e o desejo/prática sexual, no bojo da sociedade heteronormativa. Nessa linha, Butler reconceitua gênero, compartilhando certas referências com Scott, e trazendo de vez o corpo e o sexo para o campo discursivo, questionando sua pretensa materialidade. Raewyn Connell, um olhar sobre as práticas Grande referência para o campo de estudos das masculinidades, a socióloga australiana Raewyn Connell também se aventurou na conceituação de gênero, embora esse não seja seu carro-chefe. Enfatizando também o papel das construções sociais e históricas, Connell traça um caminho distinto para chegar a gênero. Ela chama a atenção para as formas como a sociedade lida com processos reprodutivos e diferenças entre os corpos e, logo, como os corpos são trazidos para as práticas sociais. Em suma, o que a sociedade faz com o corpo que lhe é dado. Heleieth Saffioti, alertando para os usos de gênero A brasileira Heleieth Saffioti, falecida há poucos anos, foi uma das mais importantes teóricas feministas do país, com reconhecimento internacional. Não podemos dizer que Saffioti inaugurou um novo conceito de gênero, mas certamente trouxe reflexões relevantes que impõem limites a certas escolas, fazendo inclusive um pedido: “feministas, usem menos gênero!” Por ser uma autora de destaque, é válido nos debruçarmos sobre suas ressalvas. Com fim eminentemente militante, Saffioti alertou para os problemas políticos do conceito de gênero, o que ainda hoje dá nós na cabeça de toda(o) feminista. Pierre Bourdieu, escrevendo sobre a dominação Muito conhecido pelas suas contribuições ao reprodutivismo e à economia simbólica, o cientista social francês Pierre Bourdieu não fez propriamente uma discussão sobre gênero, pois esse conceito não é central nos seus trabalhos. Entretanto, interessado também em um contrucionismo social (radical), Bourdieu escreve um trabalho altamente referenciado que traz contribuições – e problemas – dignos da discussão sobre o conceito de gênero. Portanto, é pertinente também discuti-lo nessa série. Com essas seis autoras, esperamos condensar e estimular reflexões sobre esse conceito – problemático, mas central – da teoria feminista contemporânea. Paralelamente a esses textos, outras discussões foram e estão sendo empreendidas em variados textos no blog. Esperamos que possa acompanhar essa série, bem como deixar seus comentários com críticas, dúvidas e sugestões. |
Fonte: Ensaios de Gênero
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