Para Cida Gonçalves, uma ação nacional de denúncia à discriminação é capaz de mobilizar sociedade sobre tais assassinatos. Ela afirma que quem comete esse tipo de crime, “quer destruir a identidade” da vítima
Envolvida na recepção às 150 mil mulheres que estão a caminho de Brasília para a Marcha das Margaridas, dia 15, a ministra da Mulheres, Cida Gonçalves, está também empenhada em lançar nacionalmente uma outra marcha: a de combate à misoginia. Ela adiantou que, neste mês, vai oficialmente dar início à mobilização junto a toda sociedade, unindo setor público e privado.
“Será a partir do dia 17. Já falei com o presidente Lula. Vou percorrer todos estados, falar com governadores, prefeitos, parlamentares, empresários e imprensa. Todos precisam se unir. Não é uma questão ideológica, está acima disso. É uma questão de marco civilizatório”, disse ao Correio.
A ministra vai buscar o engajamento masculino ao movimento. “Esse assunto não pode ficar apenas na minha fala e na da (primeira-dama) Janja. Todos os homens do governo devem participar. Não temos ainda o número de mulheres no poder como gostaríamos. Temos 45 mil homens vereadores no país e apenas 9 mil mulheres”, frisou.
Ela aponta, com indignação, que o nível de crueldade nos crimes contra a mulher vem aumentando no Brasil. “Um homem, quando é assassinado, leva dois tiros. A mulher leva 50. Porque, para o assassino, não basta matar. Tem que feri-la no rosto, nos seios; tem que destruir sua identidade feminina. Isso é o ódio, é o feminicídio”, explicou.
A ministra participou ontem, como convidada especial, de uma reunião com um grupo de representantes do setor privado, em Brasília, num evento promovido pela Coca-Cola Brasil. Foi a chamada para falar sobre empreendedorismo feminino. E convocou os presentes a participarem ativamente no combate à violência contra a mulher.
Cida alertou, também, para os dados do Anuário de Segurança Pública. “Houve aumento de estupros em crianças de zero a quatro anos em 10%. E de 60% em até 17 anos. A sociedade precisa saber. Precisamos acordar o Brasil. Esse momento nos exige uma postura, uma reação também quanto a isso”, disse.
Canais de vídeo
Segundo a ministra, há 80 canais no YouTube pregando ódio contra a mulher. “Eles têm 8 milhões de seguidores. Temos de nos opor a isso. Também irmos para as redes sociais”, garantiu. Ela lembrou da dificuldade que foi aprovar a lei para tipificar o crime contra a mulher como feminicídio.
“Os deputados diziam: ‘A senhora quer, só porque é feminista, tirar homicídio e colocar feminícidio?!’ Não é isso. Estamos falando que as mulheres estão morrendo pelo fato de serem mulheres. O feminicídio é uma morte anunciada. Vem com uma cadeia anterior de violência. Então, se tiver política pública e tiver investimento, aquela morte pode ser evitada”, afirma.
A ministra defende um conjunto de políticas públicas que permitam às mulheres também ascenderem no mercado de trabalho, recebendo apoio para cuidarem dos filhos e de tarefas domésticas. “Comentei com o presidente Lula que melhor do que baratear a máquina de lavar, é tirar a mulher dessa tarefa”.
Segundo Cida, uma prioridade é implementação da Lei 14.611, que garante igualdade salarial entre homens e mulheres. O texto foi sancionado no início de julho pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ela reforçou isso com os setores representados no encontro de ontem. “Acredito que essa lei vai ser um marco como foi a Maria da Penha”, previu.
Cida sugere a criação de lavanderias comunitárias em regiões de vulnerabilidade social e, também, horários estendidos para restaurantes comunitários. “Precisamos das creches, mas também pensar além”, conclui.