Por: Lídice da Mata
Findo esta semana com um misto de esperança e alegria em relação à luta feminista pela ocupação de espaços de discussão, representação e poder em nosso País. Primeiro, quero dizer que é com orgulho que vejo sancionada a Lei Mariana Ferrer, de minha autoria e coautoria com outras deputadas e deputados, que proíbe o constrangimento de vítimas de crimes sexuais e testemunhas durante julgamentos e audiências na Justiça. Depois, é com imenso entusiasmo que acompanho o resultado das eleições para as diversas seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), nas quais mulheres estão ganhando a presidência em diversas capitais pelo País, inclusive na minha Bahia, que terá Daniela Borges no comando.
Ainda não temos o resultado de todo o processo das eleições na OAB para fazermos uma avaliação mais robusta no que diz respeito ao crescimento desta representatividade. Mas já temos a certeza de que as mulheres comandarão estados bastante populosos e fortes, em seccionais que agregam operadores e operadoras do Direito – como chama a Justiça brasileira –, comprometidos com esta entidade que sempre esteve atuante na garantia da democracia no Brasil e no funcionamento mais igualitário e humano das instituições em nosso País.
Os resultados, extremamente animadores, nos mostram, porém, a exata dimensão da estrada a ser percorrida. Foram 22 mulheres disputando a presidência das seccionais em 2021, o que representou 27% do total das candidaturas. Hoje, os 27 presidentes de seccionais são homens. Nacionalmente, jamais a OAB teve uma mulher no comando do seu cargo máximo.
Enquanto isso, as manchetes dos veículos de imprensa, principalmente os que trazem conteúdos jurídicos, noticiam que a vitória das mulheres nas presidências das seccionais do País é a primeira em muitas cidades brasileiras. A expressão “primeira” é usada com insistência por ser mesmo inédito tal feito. Durante a escrita deste artigo, 24 estados já tinham sua votação encerrada e quatro deles elegeram mulheres no comando de suas Seções da OAB: Bahia, São Paulo, Santa Catarina e Paraná.
Para os que não estão familiarizados com esse “universo da OAB”, e aí quero dizer que também não me faço especialista na Ordem, tomo aqui o direito (com letra minúscula, mas já fazendo uma brincadeira), de me arvorar a falar sobre, pois é preciso destacar a importância da eleição de mulheres nesta instituição no atual contexto. É preciso dizer que a OAB sempre foi, assim como muitos espaços de poder no Brasil e no mundo, uma casa ocupada na sua maioria por homens. Uma casa que até bem pouco tempo nem previa a cota de representatividade feminina em suas chapas para eleições internas, só aprovando tal regra no ano passado. Só isto já é em si, simbólico!
Vejam vocês que em seus assentos vitalícios no Conselho Federal da Ordem, onde estão os conselheiros que já foram presidentes da OAB, não há uma única mulher para garantir um voto minimamente afinado com reivindicações da pauta feminista, tanto para questões voltadas à advocacia em si, quanto para discussões importantíssimas sobre se a Ordem apoia ou não o impeachment de um Presidente ou Presidenta da República.
Por tudo isso, é que precisamos comemorar a vitória dessas mulheres no comando das seccionais da OAB, pois elas abrem portas para que outras instituições, entidades, organizações da sociedade civil e espaços governamentais se organizem para que muito mais mulheres cheguem a cargos de comando. É urgente que possamos imprimir a este País, e quiçá ao mundo, um olhar feminista na construção de leis, projetos, ações e decisões judiciais que possam dar conta das demandas e dos direitos que devem alcançar as mulheres na sua totalidade.
Comecei este texto falando da alegria que é ver sancionada uma lei que garanta o mínimo de acolhimento e dignidade durante um julgamento em que a mulher é a vítima; e onde homens – advogados e juízes – julgam sua “conduta” num crime de estupro amplamente noticiado e comprovado. É mais do que simbólico que a OAB, com suas advogadas atuantes e no comando, seja transformada pela potência dessa força feminista. É educador, é representativo, é encorajador, é promissor!
A Ordem dos Advogados do Brasil – que na sua nomenclatura assim já nos exclui, tal qual a Câmara dos Deputados, da qual faço parte -, foi vanguardista em vários momentos da história do País, mas pecou ao demorar em garantir representação igualitária entre homens e mulheres nos seus espaços. Contudo, pode agora, com a eleição de 2021, dizer que começou um novo tempo. Um tempo em que muito em breve também uma mulher ocupará a presidência da OAB Nacional. Tal qual uma mulher comandou a presidência do País, tal qual mulheres comandarão a presidência da Câmara e do Senado, tal qual outras mais estarão nas presidências das Cortes de Justiça deste imenso Brasil e em todos os espaços onde quisermos estar. Avançaremos e em todos os espaços haveremos de revolucionar normas e conceitos, pois, a frase a seguir não é minha, mas, certamente, haverá licença para este afetuoso empréstimo: a revolução será feminista ou não será!
Fonte: Congresso em Foco