Brasil não pode desperdiçar potencial das que, contra a vontade, deixam de trabalhar depois da maternidade
Em 2022, 11,1 milhões de mulheres foram obrigadas a deixar o mercado de trabalho para cuidar de filhos recém-nascidos, embora desejassem permanecer ativas, revelou estudo do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made) da USP. Se essas mulheres tivessem tido a oportunidade de continuar trabalhando, a força de trabalho teria aumentado em 10%. Num momento em que a população envelhece rapidamente, o Brasil não pode desperdiçar o potencial dessas mulheres que desejam equilibrar a maternidade e a carreira.
As estatísticas revelam disparidade alarmante, com 6,8 milhões (42,1%) das mulheres negras e 4,3 milhões (34,4%) das brancas afastadas da força produtiva devido à maternidade. Em contraste, apenas 5% dos homens enfrentam essa situação. A alocação eficiente da mão de obra feminina é fundamental para impulsionar o crescimento econômico.
Nos Estados Unidos, um estudo calculou em 20% da expansão do PIB americano entre 1970 e 2010 a contribuição dada pela entrada da mulher no mercado de trabalho. “Igualdade de gênero pode gerar ganhos para a economia. A alocação melhor dessa mão de obra potencializa o crescimento e a produtividade, que têm patinado nos últimos anos”, diz a economista Janaína Feijó, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre).
Diversas medidas concretas poderiam apoiar as mulheres que desejam conciliar maternidade e carreira. Um edital da Faperj oferece auxílio a mães cientistas com filhos de até 12 anos de idade. É o tipo de iniciativa que pode ter impacto positivo na retenção e no avanço das mulheres no mercado de trabalho. A implementação de mais creches em tempo integral, a concessão de licença-paternidade e o apoio das empresas também são passos essenciais.
Tem havido, é verdade, avanços notáveis na inclusão da mão de obra feminina. De acordo com dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI), houve desde 2008 crescimento de 57,5% nas mulheres atuando em setores de tecnologia e engenharia. Cargos antes tidos como província quase exclusivamente masculina hoje já reúnem 397 mil mulheres. No entanto ainda há desperdício notável de talento e potencial feminino, especialmente porque as profissionais muitas vezes se veem obrigadas a interromper a carreira depois da maternidade. Nos Estados Unidos, um estudo constatou que 43% das cientistas que haviam acabado de ser mães estavam em trabalhos temporários ou saíram do mercado. No Brasil, não faz sentido pesquisadoras dedicarem anos de trabalho e investimento na própria formação, com bolsas de estudos pagas pelo Estado, para ficarem inativas ao ter filhos.
É preciso criar um ambiente mais inclusivo e favorável às mulheres no mercado de trabalho. A necessidade de apoio, especialmente àquelas que são mães, merece atenção e ação imediata.
Fonte: O Globo