Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, destacou a importância da existência de políticas ambientais que levem em consideração as comunidades tradicionais. Para Marina Silva, mudanças do clima afetam com mais intensidade os pobres
“As mulheres negras, quilombolas e indígenas sustentam a força desse país.” A fala da ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, faz referência aos dados do Censo Quilombola, que demonstraram que um terço da população quilombola do Brasil está concentrada no Pará. Evento que antecede à Cúpula da Amazônia, Diálogos Amazônicos promoveu ontem a mesa Mulheres pelo bem viver, a justiça climática e combate à desigualdade. O debate também contou com a participação das ministras Marina Silva (Meio Ambiente) e Cida Goncalves (Mulheres); e da presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joênia Wapichana.
Segundo dados do Censo, mais de 166 mil quilombolas estão no Norte do país, sendo residentes de territórios oficialmente delimitados e de fora. “Quando a gente fala não fala da boca para fora, a gente está falando com base em dados e pesquisas”, reforçou Anielle. Marina afirmou, por sua vez, que “os problemas da mudança do clima afetam de forma diferente e com mais intensidade os mais pobres, o povo preto, os povos indígenas, as pessoas que foram vulnerabilizadas”.
A pauta do racismo ambiental foi levantada por Anielle Franco. O conceito envolve comunidades racializadas e os locais onde elas pessoas vivem — o fato de uma comunidade de maioria negra morar em regiões de encosta, sujeitas a deslizamentos de terra, por exemplo.
A presidente da Funai refletiu a questão e destacou a importância da participação dos indígenas nos debates de preservação ambiental e mudança de clima, mas também sobre o Marco Temporal. “Quando nós falamos de direito coletivo, envolve mulheres, jovens, crianças, idosos. É um ponto de ligação constitucional da Funai que é justamente voltar a lutar pela demarcação das terras indígenas. O governo Lula agora, com seis meses, a Funai já retoma principalmente esse direito central que é a demarcação das terras. É a nossa demanda prioritária”, observou Wapichana.
À imprensa, Cida Gonçalves afirmou que o Ministério das Mulheres trabalha junto ao dos Povos Indígenas em um programa chamado Mulheres Guardiãs. “Nós estamos discutindo a questão da Casa da Mulher Brasileira para atender também as mulheres indígenas vítimas de violência”, destacou. “Aqui, no Pará, já vamos inaugurar uma em Ananindeua. Temos um terreno aqui em Belém, e vamos ter em Marabá, Santarém… e depois fazer a divisão dos territórios onde elas serão instaladas”, apontou.
As cinco plenárias principais dos Diálogos Amazônicos formularão relatórios que serão lidos aos líderes dos oito países que compõem a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), durante a Cúpula da Amazônia, incluindo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que chega à capital paraense na próxima terça-feira.
Plano Safra
“Saúde, soberania e segurança alimentar e nutricional” foi o tema da plenária que aconteceu depois, durante a tarde de ontem. Representando o governo no debate estavam os ministros Wellington Dias, do Desenvolvimento e Assistência Social; e Paulo Teixeira, do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar. Lideranças brasileiras e estrangeiras também marcaram presença.
Durante o evento, o governo lançou o Plano Safra voltado à liberação de crédito para a agricultura familiar. Além disso, um plano de florestas produtivas, que irá financiar a aquisição de sementes, construção de viveiros e ações de assistência técnica e extensão rural, está sendo construído.
O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o programa de compras institucionais, que obriga hospitais públicos, universidades e as Forças Armadas a adquirirem, no mínimo, 30% de alimentos dos agricultores familiares, tal qual o PAA, foram algumas das medidas do governo destacadas no evento por Teixeira no combate à fome e incentivo aos produtores. “Aqui, no Norte, já começamos a comprar R$ 60 milhões dos produtos que o agricultor familiar produz para entregar para aquelas famílias vulnerabilizadas e que estão vivendo com a insegurança alimentar grave”, observou o ministro.
Há ainda uma proposta para a criação de um programa de garantia de preço mínimo da biodiversidade (PGMBio), com o objetivo de prevenir que os valores repassados para esses investimentos sejam absorvidos exclusivamente por atravessadores — intermediários entre produtor e consumidores —, muitas vezes os responsáveis pelo financiamento de lavouras.
Transferência de tecnologia para países amazônicos
A ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, anunciou, durante o Diálogos Amazônicos, a transferência de tecnologias de monitoramento entre os países amazônicos que compõem a Organização do Tratado de Cooperação da Amazônia (OTCA).
“A ciência e a tecnologia perpassam praticamente todos os desafios de sustentabilidade da Amazônia, não só o monitoramento, mas o próprio desenvolvimento por meio da biodiversidade e dessa riqueza que é tão diversa na Amazônia. Para transformar os fármacos, os minerais, a diversidade de flora em algum produto ou serviço, tudo isso precisa da ciência e tecnologia, desenvolvimento e pesquisa”, declarou.
Segundo Luciana, o país tem a expertise no monitoramento do bioma amazônico, pelas ferramentas que o Brasil contém, incluindo a “constelação de satélites robusta” que o país possui, “que agora, com o passo que estamos dando para o Cbers-6, que é um desenvolvimento de tecnologia comum que desenvolvemos com a China desde a década de 1980, vamos poder fazer o imageamento através das nuvens na Amazônia”.
A ideia, continuou, é “melhorar a tecnologia para garantir os dados e levar o conhecimento da leitura desses dados para os pesquisadores dos outros países para que eles possam acompanhar o nosso modelo”. “Temos o Deter — que dá informações da cobertura florestal na Amazônia, feito pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) — em tempo real, diariamente, temos o Prodes (Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite), que é anual, ou seja, são modelos, programas que desenvolvemos e queremos partilhar.”
Além da transferência de tecnologia, será oferecido capacitação aos cientistas dos demais países pelo Inpe. Nesta segunda-feira, a ministra anunciará, ainda, o programa Mais Ciência na Amazônia, com investimentos no valor de R$ 3,4 bilhões do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), entre 2024 e 2026.