*Artigo de autoria de Rosângela Bittar, chefe da Redação do jornal Valor Econômico, em Brasília, e publicado na edição desta quarta-feira (13) Na entrevista com que brindou a imprensa para oferecer-lhe os resultados de uma pesquisa que encomendou ao MDA, instituto do qual é cliente, o presidente da Confederação Nacional dos Transportes, senador Clésio Andrade (PMDB-MG), apresentou uma coleção completa das distorções que têm solapado a credibilidde das pesquisas eleitorais no Brasil. Desconsiderou a candidatura do ex-governador José Serra (PSDB), decidindo por convicção pessoal que ele não será candidato; duvidou da candidatura Eduardo Campos (PSB), afirmando que ele próprio já disse (ele nega) que não sabe se será candidato ou se a candidata será Marina Silva; e ousou fazer uma distribuição discricionária dos benefícios de programas e dos votos de Marina entre os candidatos, pela qual Dilma Rousseff (PT) herda a maior parte. Nada desse festival de arbítrio teve sua razão explicada. Desenhou os cenários que quis para o trabalho do instituto do qual é cliente e parceiro, e analisou os dados também como se analista de pesquisa fosse, sem ressalvas. Clésio é integrante da base de apoio à reeleição da candidata líder, Dilma Rousseff, e dá a opinião que quiser sobre os resultados de pesquisas, encomendadas por ele ou não, por outros políticos do seu grupo e de sua aliança eleitoral, tenham que objetivos tiverem. Cabe à imprensa, porém, que tem responsabilidade com a informação, não tomar suas opiniões como se ciência fossem, porque não são. O objetivo, hoje, é fazer acreditar em vitória no 1º turno Uma pesquisa como essa, além de outras feitas a soldo de clientes engajados, eles próprios candidatos ou com um objetivo de fortalecimento do seu poder dentro da aliança, ou de partidos políticos, perde em capacidade de projetar o que vai ocorrer mais adiante, no futuro próximo, uma das principais finalidades, se não a principal, de pesquisas eleitorais nesse momento, para referência do eleitor. É um desvirtuamento decorrente do rei dos equívocos, que é a dupla militância do instituto de pesquisa, que trabalha para partidos, candidatos, organizações representativas de grupos, interessados em eleger determinados políticos. Com a exceção conhecida, no Brasil, do Datafolha, que não trabalha para partidos e candidatos. O país partiu para mais uma campanha eleitoral sem ter superado a distorção. Está claro que as pesquisas de agora, tendo como cliente o governo, ou o PT, ou seus partidos coligados, têm um objetivo às vezes até declarados. Sua batalha do momento é fazer crer que a candidata Dilma Rousseff vai vencer no primeiro turno. Não para forçar de verdade a vitória no primeiro turno, isto ainda é uma questão da estratégia da campanha no ano que vem. Mas para ter efeito em uma ação que se desenrola agora: a negociação das alianças nos Estados. Destinam-se a criar um clima que facilite a montagem dos palanques estaduais. Assim, é compreensível que os clientes de pesquisas definam as perguntas do questionário e analisem os dados como lhes aprouver tendo em vista o objetivo do momento da campanha, que é esse da vitória no primeiro turno. Mas é também nítido que a imprensa não deve tomar a iniciativa partidária como verdade científica. Por exemplo, um dado que retrataria bem a realidade do momento e que está sendo omitido de pesquisa divulgada, talvez porque não interesse ao freguês, é que, quando apresentado o candidato e seu principal apoiador, como se fossem uma chapa, o resultado muda totalmente o quadro eleitoral: Dilma-Lula, Eduardo-Marina, Aécio-Fernado Henrique. Fica evidente, segundo quem conhece os dados, a transferência de votos de Marina para Eduardo, reduzindo a diferença entre ele e a candidatura líder e definindo o segundo turno entre os dois. O que, evidentemente, não interessa a quem quer fazer crer que tudo será liquidado no primeiro turno nem a quem ficaria de fora do segundo. No lusco-fusco dos dados o MDA mostrou dados de pesquisa anterior sobre para quem iriam os votos de Marina: 7% para Dilma, 4% para Aécio, 4% para Eduardo Campos, 5% para brancos e nulos e 2% para indecisos. Diante da pergunta sobre a ausência de tão precisa distribuição do texto por escrito com os dados da pequisa, o repórter Fábio Brandt, doValor, ouviu que isso constaria apenas da análise oral, não da impressa. O presidente da CNT deixou dúvidas também sobre suas considerações a respeito dos benefícios para a candidata Dilma Rousseff dos programas Mais Médicos e leilão de Libra. Ao exaltá-los, foi confrontado com a estagnação dos índices de intenções de voto e da avaliação do governo. Em seu socorro, o diretor do Instituto MDA, Marcelo Souza, disse ao repórter que a avaliação do presidente da CNT tinha base nas “simulações de segundo turno” e não “nos cenários de primeiro turno”. Compreender, quem há de? No berço das pesquisas eleitorais o cidadão não é mais um paciente dessas distorções. Se o eleitor vê uma pesquisa da CNN, sabe que foi feita por um instituto que não conduz a campanha eleitoral de ninguém. Quando a imprensa divulga uma pesquisa de instituto que trabalha para partidos, diz isso com todas as letras – instituto que trabalha para os republicanos, ou instituto que trabalha para os democratas. E há os que trabalham para meios de comunicação, emissoras de TV, jornais, e atualmente também para blogs. Não há restrições nem legislação sobre pesquisa, e o bom senso do mercado fez todas as distinções por ele mesmo. Aqui há legislação, limites, metodologia, regras de divulgação, proibições, que resultam num cipoal de descontrole que transforma as pesquisas em peças de campanha quase individuais, pois qualquer político pode usar o instrumento como uma baliza de sua própria carreira. Tudo isso, principalmente a dupla militância dos Institutos, tem minado a credibilidade das pesquisas, mas com certeza não será o projeto do senador Luiz Henrique (PMDB-SC), que proíbe divulgação de pesquisa 15 dias antes do pleito, que vai corrigir tão acentuado desvio. |
*Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras
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