Frida Kahlo e Violeta Parra são as primeiras protagonistas da coleção, que em breve ganhará um número dedicado a Juana Azurduy
Ilustração do livro sobre Frida Kahlo, que mostra a pintora ainda bebê Elas não viveram em castelos, não se destacaram por sua dedicação aos afazeres domésticos, não sonharam com bailes em palácios e príncipes encantados. As personagens dos livros infantis recém-lançados pela editora Chirimbote, da Argentina, são mulheres reais e fantásticas, que marcaram as artes e a história da América Latina. A pintora mexicana Frida Kahlo e a multitalentosa Violeta Parra, ícone da música popular chilena, são as protagonistas dos primeiros livros da coleção “Antiprincesas”, que em breve ganhará mais um número, dedicado à vida de Juana Azurduy, heroína das lutas pela independência da Argentina e da Bolívia. “Escolhemos mulheres que transcenderam sua época, que romperam com o que se esperava delas, mas que também tenham trabalhado com outras pessoas e se dedicado a construir de forma coletiva. Essa é uma condição para ser antiprincesa”, explica Nadia Fink, autora dos livros em parceria com o ilustrador Pitu, em entrevista a Opera Mundi. “As princesas esperam sozinhas, buscam a felicidade individual e um final feliz em que necessariamente aparece um príncipe ou, no máximo, uma família. Nós valorizamos outras formas de viver”. E é por isso que entre fotos de Frida quando criança e ilustrações que recriam seus quadros e seu inconfundível buço, salta do texto um pequeno box com a definição de revolução – “quando se modifica o que está mal (entre muitas pessoas)”. A explicação aparece na parte da história em que se conta que, apesar de casados, o muralista Diego Rivera e Frida “tiveram outros amores, mesmo estando juntos” e que “para Frida, o amor acontecia com homens e com mulheres.” Coleção Antiprincesas conta histórias de mulheres latino-americanas “Como explicar essa tentativa [de Diego e Frida] de viver um amor livre, de não se relacionar de maneira estereotipada, de considerar a possibilidade de estar com outras pessoas, sem explicar que isso aconteceu em um contexto revolucionário?”, indaga Fink. Já a antiprincesa Violeta Parra, nascida em uma família de trabalhadores pobres, é autodidata, multitalentosa e viaja por seu país, Chile, compilando canções populares que comoveram o mundo em sua voz poderosa. “Graças ao violão, deixei de descascar batatas.” Quando Violeta se separa de seu primeiro marido, Luis Cereceda, um pequeno quadro com um bigode abre aspas: “Pode ficar com a sua arte, eu vou embora para sempre”. E na página seguinte, uma ilustração de um homem partindo, enquanto uma mulher sorri e abraça seus filhos enquanto diz que sua única vantagem em relação a outras mulheres do Chile “é que, graças ao violão, deixei de descascar batatas.” “Não queríamos maquiar essas mulheres ou retratá-las de forma leviana, porque foram mulheres que trabalharam com profundidade tudo que fizeram”, frisa Fink. Capa do livro que narra a história da artista chilena Violeta Parra A autora explica que os livros retratam o caminho político de suas protagonistas, independente de suas posições partidárias ou ideológicas, com o cuidado de não transformar os contos em panfletos. “A intenção é disparar ideias nas crianças, não apresentar pensamentos fechados. Não queremos diminuir cabeças, queremos ampliá-las”, avisa a escritora. “Também não queremos matar as princesas, queremos mostrar outras realidades com as quais as crianças possam se identificar.” Frida e Violeta não viveram felizes para sempre. A pintora mexicana morreu jovem depois de uma longa agonia e de uma vida marcada pelas doloridas sequelas de um acidente na adolescência. A cantora chilena se suicidou pouco antes de chegar aos 50 anos. Para falar desses desfechos que não se parecem a contos de fadas, Fink optou pelo realismo mágico, no caso de Frida, e por deixar em aberto, no caso de Violeta. “Decidimos falar da morte de Frida a partir das lendas mexicanas. No caso de Violeta, preferimos deixar que cada adulto que esteja acompanhando a criança que lê o livro decida como abordar o assunto”, explica. Depois das histórias, os livros convidam os pequenos leitores a fazer autorretratos em frente ao espelho, como fazia Frida, e a pesquisar canções antigas em conversas com pessoas mais velhas, como fazia Violeta. Convidam crianças a brincar de ser antiprincesas. Aline Gatto Boueri |
Fonte: Ópera Mundi
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