Apenas 30% das personagens de filmes são mulheres e a sexualização é o padrão para representá-las
Recente estudo realizado pelo Instituto Geena Davis de Gênero na Mídia, com o apoio da ONU Mulheres e da Fundação Rockefeller, revela que as mulheres são sub-representadas e estereotipadas na produção cinematográfica mundial. A pesquisa “Preconceito de gênero sem fronteiras: Uma pesquisa sobre personagens femininos em filmes populares em 11 países” analisou filmes populares da Austrália, Brasil, China, França, Alemanha, Índia, Japão, Rússia, Coreia do Sul, Estados Unidos e Reino Unido e teve como objetivo explorar a visibilidade e a natureza das representações femininas em filmes de todo o mundo. Os resultados revelaram que somente 30,9% de todas as personagens eram mulheres. Entre as protagonistas, elas são apenas 23,3%. As mulheres quase não aparecem nos filmes de ação/aventura, estão mais presentes em estórias de comédia e drama. Em relação à representação, há uma discrepância em comparação aos homens quanto à sexualização: “as mulheres foram duas vezes mais propensas que os homens a serem mostradas em trajes sexualmente sensuais (24,8% versus 9,4% deles), transparentes (38,5% versus 15,7%) e parcialmente ou totalmente nuas (24,2% versus 11,5%). Tal exposição pode contribuir ou reforçar a vergonha do corpo, ansiedade com a aparência ou internalização do ideal de magreza entre algumas mulheres. Uma preocupação é com a sexualização precoce de adolescentes entre 13 e 20 anos, propensas a serem sexualizadas como mulheres adultas jovens (21-39 anos), adverte o estudo. “Juventude e beleza são claramente dois componentes importantes de retratos femininos em filmes globais. O foco na idade e a sexualização das personagens femininas tornam-se particularmente problemáticos porque influencia como as mulheres se enquadram no local de trabalho, onde as percepções de competência podem estar ligadas a aspectos da aparência”. E, relativo ao mundo do trabalho, o estudo analisou se os filmes representam a realidade vivenciada pelas mulheres nos dias atuais. O resultado diz que não, em todos os países analisados elas foram sub-representadas no mercado de trabalho quando personagens em comparação às percentagens reais globalmente verificados. Somente na Índia, houve uma menor discrepância em relação a este aspecto. No geral, personagens masculinos têm desproporcionalmente ocupações mais poderosas do que os seus homólogos do sexo feminino. De quase 10 homens em posições de poder político, apenas uma mulher aparece. Como resume o estudo, “uma delas, uma representação ficcional da chanceler alemã, Angela Merkel, nem sequer fala. Outra, uma fêmea elefante chamada Angie, trouxe seus componentes em conjunto para mobilizar recursos ao aquecimento global ameaçada a sua existência. Por fim, a única protagonista feminina que tinha poder no cenário mundial era Margaret Thatcher em “A Dama de Ferro”. Curiosamente, devido ao enquadramento da carreira política de Thatcher, ela é responsável por 3 das 12 representações políticas de alta potência. Isso se traduz em apenas 10 mulheres, únicas na autoridade política em 120 filmes e 5.799 personagens falando”. O resultado disso pode ser a falta de oportunidade de jovens espectadores verem modelos femininos poderosos em posições de liderança dentro de seus próprios países. Além disso, parece que as executivas são uma espécie em extinção em filmes internacionais. Não apenas as mulheres em cargos de poder político estiveram sub-representadas e estereotipadas na amostra analisada. Estereótipos sufocam as mulheres em cargos poderosos em toda a área do Direito (9% das advogadas), na Academia (5,9% das professoras) e na Medicina (14,8% das médicas). Somente duas advogadas (e 20 homens) foram mostradas e apenas uma juíza (versus 19 do sexo masculino) apareceram em todos estes 120 filmes. Resultados não animadores também foram verificados para mulheres atletas e religiosas: embora os Jogos Olímpicos proeminentemente apresentem atletas do sexo feminino e a Igreja da Inglaterra permitiu recentemente bispas, estes retratos estão quase ausentes em longas-metragens. Apenas cinco mulheres foram retratadas como atletas, treinadoras ou locutoras esportivas em comparação com 117 homens e duas mulheres foram mostradas em algum tipo de carreira religiosa – um par de freiras brasileiras. Já os homens foram retratados em uma série de mensagens espirituais, incluindo, mas não limitado a sacerdotes hindus, monges budistas, pastores, diáconos e até mesmo um imã. Em contrapartida, no jornalismo, houve uma percentagem mais elevada das mulheres na força de trabalho, 40%. Segundo a pesquisa, “dada a importância do jornalismo para um informado e educado círculo eleitoral, é gratificante ver que as mulheres da ficção têm um papel a desempenhar no fornecimento de notícias aos seus concidadãos”, no entanto, o jornalismo forneceu um exemplo solitário de um setor profissional em que as mulheres na ficção prosperam. No mais, melhores representações de mulheres que trabalham em prestigiadas funções profissionais ou especializadas em todos estes setores poderiam oferecer aos telespectadores jovens um vislumbre de possibilidades de carreira. Mas o relatório revela que mundialmente os filmes colocam as mulheres em papéis ocupacionais com bastante moderação. Mulheres por trás das câmeras Entre as cineastas, também há desigualdade de gênero: apenas 20,5% eram mulheres e 79,5%, homens. As mulheres representaram 7% de diretoras, 19,7% de roteiristas e 22,7% de produtoras. Interessante observar que filmes com diretora ou escritora têm significativamente mais meninas e mulheres na tela do que aqueles sem um diretor ou escritor do sexo feminino. Isso pode ser explicado pelo fato das mulheres talvez serem mais propensas a contar histórias com personagens e experiências femininas, explicação que reflete o ditado “escrever o que você sabe”. Por outro lado, a hipótese pode restringir o leque de direção dado às mulheres. Cinematografia brasileira Como já mencionado, o Brasil foi um dos países analisados na pesquisa e apresentou um percentual de mulheres representadas em seus filmes maior que a média mundial: 37,1% (a média global foi de 30,9%), ficando nas três melhores posições do ranking juntamente com o Reino Unido e a Coreia do Sul. O país também ficou acima da média em relação às mulheres diretoras (9,1%, a média é 7%); roteiristas (30,8%, a média é 19,7%) e produtoras (47,2%, sendo a média 22,7%). Por outro lado, os filmes brasileiros mostram, acima da média, representações femininas em trajes sexualmente atraentes (28,7%, a média foi 24,8%) e algum tipo de nudez (28,7%, a média foi 24,2%). A pesquisa afirma que uma chamada para a mudança é crucial. Meninas e mulheres compreendem 50% da população mundial, mas estão em um percentual muito menor no cinema internacional. Pedir aos cineastas a criação de mais papéis para meninas e mulheres não é pedir o impossível, acredita o relatório. “A adição de meninas e mulheres para histórias significa conceituar um mundo ficcional que parece surpreendentemente como a que já habitam. Em segundo lugar, uma chamada para ser criativo é necessária. Personagens femininas podem e devem facilmente preencher uma quota equivalente das posições da força de trabalho e influência em todos os setores simplesmente através da imaginação dos seus criadores. Conceber CEOs do sexo feminino, políticos, advogados, juízes e médicos é a obra de um momento de escrita criativa, podendo ter consequências importantes e duradouras para a próxima geração”. |
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Fonte: Jornal Mulier – www.jornalmulier.com.br
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