Após nove dias do desempenho histórico nos Jogos Pan-Americanos de Santiago-2023, com protagonismo feminino no número de medalhas conquistadas, Isabel Swan foi demitida da Coordenadoria da Área Mulher no Esporte, destinada exclusivamente à elaboração de projetos para atletas, treinadoras e gestoras mulheres, criada em junho de 2021 e para o qual Isabel passou por processo seletivo. O Comitê Olímpico o Brasil (COB) informou que “por decisão executiva optou por mudanças na área”, mas não informou quem ocupará o cargo. O GLOBO apurou que Julia Silva (ex-Confederação Brasileira de Vôlei) e Soraya Nobre (ex-Confederação Brasileira de Basquete) foram contratadas para a mesma área porém com outros cargos.
Isabel, medalhista olímpica de bronze na vela, em Pequim 2008, explicou que lhe foi dito que a área seria reestruturada. Mas, ela aponta questões políticas para a mudança. Disse que houve uma mudança de diretoria com a saída de Jorge Bichara, ex-diretor de Esportes, e a entrada de Kenji Saito, para desenvolvimento, e Ney Wilson, para alto rendimento, e que passou a não ter mais autonomia nas tomadas de decisão. Ela estava sob o guarda-chuva de Saito apensar de entender que a área na qual trabalhava era “transversal” e deveria “conversar com as mais diferentes áreas”.
Quando foi contratada, a proposta era realizar uma análise minuciosa da participação feminina no esporte brasileiro tanto no ambiente competitivo como fora dele, cujo escopo de atuação não se limitaria ao suporte às atletas olímpicas ou com potencial para disputar os Jogos. À época, renunciou à Comissão de Atletas do COB, que ajudara a criar, para ocupar este cargo.
— Essa é uma área forte e de muita influência política e talvez estivesse avançando muito sob a minha coordenação… e quiseram manter esse controle, me botar de lado. Esse é o modelo de liderar desta gestão e que eu discordo — analisa Isabel, que conta que a novas contratações para o seu lugar ocorreram durante suas férias: — Sou uma medalhista olímpica, uma ex-atleta, tenho formação e estava finalizando um mestrado na Alemanha com o apoio do COB, pelo qual agradeço. Mas, infelizmente fui desligada.
Ela disse que percebeu que poderia ser demitida quando não tinha mais autonomia para tomar decisões e “mal conseguia trabalhar”:
— Não foi tão surpresa… Desde a minha entrada (maio de 2021), houve uma mudança na minha área e estava sentindo muita dificuldade de trabalhar com a minha chefia direta . Talvez eu quisesse dar celeridade a algumas ações e existe um tempo para as coisas acontecerem — comenta Isabel, que também integra a Comissão de Atletas da Panam e continua a velejar nas horas vagas: — Termino a minha jornada com um curso de equidade de gênero, entregue com muito amor e que deve sair em breve para a comunidade esportiva. E com mais ginecologistas e mais médicas do esporte, com mapeamento das entidades, com uma comissão da mulher, com realização de fóruns… muita coisa implementada, mas com muita dificuldade de seguir com uma gestão com a qual não me adaptei.
Difícil equidade
Isabel chama a atenção para o fato de que abrir as portas para as mulheres no Esporte é uma tarefa árdua. E que Tóquio-2020 representará a equidade de gênero entre os atletas mas que o caminho para as mulheres na área de gestão, direção e até na esportiva, incluindo áreas da medicina e de treinadoras, o espaço é ainda restrito.
Ela lembra que o COB, apesar de ter grande participação feminina em seu quadro operacional, tem apenas uma mulher entre os diretores, quem de fato tomam as decisões.
Além do presidente Paulo Wanderley e de seu vice Marco La Porta, são sete diretores homens: Rogério Sampaio (Diretor Geral), Luciano Hostins (Diretor Jurídico), Gustavo Herbetta (Diretor de Marketing), Paulo Conde (Diretor de Comunicação), Ney Wilson (Diretor de Alto Rendimento), e Kenji Saito (Diretor de Desenvolvimento Esportivo). Isabele Duran (Diretora Financeira e Administrativa) é a exceção.
Na coletiva para o balanço da participação do Brasil em Santiago-2023, com protagonismo feminino e realizada pelo COB na Casa Brasil em Santiago, não havia uma mulher sequer na bancada. Foram destacados: La Porta, Rogério Sampaio, Ney Wilson, Keinji Saito e Sebastian Pereira (gerente de alto rendimento) e houve constrangimento quando se comentou o protagonismo feminino no evento.
— A diferença é muito grande. Eu tentei, dei o meu melhor. Eu fiz uma boa base e tenho certeza que a Julia e Soraya chegaram para somar — lamenta Isabel: — Seguirei no movimento olímpico sempre com os valores da amizade, respeito e excelência.
Via nota, o COB explicou que Isabel foi desligada “por decisão executiva”, e que “optou por realizar mudanças na área Mulher no Esporte”. Diz ainda que “duas novas colaboradoras, já integradas à equipe, serão responsáveis por conduzir os programas pertinentes”
O texto segue: “além da manutenção dos projetos pré-existentes, a área concentrará ainda mais esforços na formação de atletas e treinadoras, com a expansão do Programa de Desenvolvimento do Esporte Feminino (PDEF), cujo orçamento será praticamente dobrado para 2024”.