A Justiça da Índia condenou à morte, na semana passada, quatro dos seis homens que estupraram, torturaram e mataram uma fisioterapeuta de 23 anos, no final de 2012, em Nova Déli. O episódio brutal despertou uma série de protestos no país em favor de alterações na legislação sobre violência contra a mulher. Com ampla repercussão internacional, as manifestações exerceram pressão decisiva para que o processo fosse julgado em menos de um ano. Milhares de ativistas comemoraram, mas sabem que o julgamento foi resposta pontual ao assassinato da jovem. Falta muito para a Índia mudar a histórica indiferença do Estado em relação aos crimes de gênero –algo epidêmico em diversos países da Ásia e da África. Ineficiência policial, impunidade e questões culturais deixam a mulher indiana tão vulneráveis que, segundo estimativas oficiais, apenas 2% dos estupros são reportados –contra 10% da média mundial, patamar já inaceitável de subnotificação. Agrava o problema na Índia o fato de somente 26% dos casos conhecidos resultarem em condenação –0,5% do total. A discriminação pelo gênero, na Índia, acompanha a mulher desde o ventre: abortos de fetos femininos são muito mais comuns. Na infância, as meninas morrem com mais frequência que os meninos, resultado de abusos e negligência. No casamento a violência é particularmente marcante pela cultura do dote. Embora ilegal, a prática persiste, e desavenças relativas ao valor que a família da noiva deveria pagar ao futuro marido provocaram mais de 8.000 assassinatos de mulheres apenas em 2012. Nada disso mudará no curto prazo, mas é alvissareiro que, desde os protestos pelo assassinato da fisioterapeuta, milhares de mulheres tenham se sentido encorajadas a denunciar abusos, desde estupros até ataques com ácido. Além disso, o Legislativo especificou novos tipos de crime, ampliou o conceito de estupro e endureceu suas penas. Modificações legais, contudo, não bastam para coibir práticas inaceitáveis e têm pouca relação direta com a impunidade. Também não será por esse caminho que as mulheres alcançarão maior participação no mercado de trabalho ou nas tomadas de decisão. Merecem atenção, ainda assim, as primeiras respostas institucionais que o país oferece a um problema gravíssimo não só na Índia, mas em todo o mundo. |
Fonte: Folha de São Paulo
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