A editoria do periódico Menopause: The Journal of The North American Menopause Society – considerada a melhor publicação de estudos da menopausa do mundo – ao enviar aos autores a comunicação de que o artigo que lhe fora submetido, “Envelhecimento, obesidade e multimorbidade em mulheres de 50 anos ou mais: um estudo de base populacional”, estaria na seção Publish Ahead of Print do website – em que os trabalhos são disponibilizados antes do impresso – enfatiza que “o artigo apresenta informações que merecem grande exposição não apenas na comunidade científica, mas também, entre a população leiga”. Encoraja sua divulgação junto à imprensa brasileira e revela-se ansiosa por receber as matérias tão logo publicadas, para mantê-las em seus arquivos. Em edição subsequente, a revista publicaria um estudo, realizado pelo mesmo grupo, sobre os “Fatores associados à autopercepção da saúde em mulheres brasileiras com 50 anos ou mais: estudo populacional”. As duas publicações originam-se de um estudo populacional financiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) intitulado “Condições de saúde em mulheres com 50 anos ou mais, em Campinas SP”. A pesquisa, desenvolvida junto ao Caism/Unicamp (Hospital da Mulher Dr. José Aristodemo Pinotti) por uma equipe do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, serve de base para o doutorado da ginecologista Vanessa de S. Santos Machado, que organizou o questionário aplicado e realiza a análise dos dados com a orientação do professor Aarão Mendes Pinto Neto. Conta com a coorientação da pós-doutoranda Ana Lúcia Ribeiro Valadares e a participação de Lúcia Costa Paiva, responsável pelo grupo de climatério, ambas ginecologistas. Mais três trabalhos resultantes da pesquisa aguardam publicação e o professor Aarão estima que resultem dela ainda de 12 a 15 artigos. Ao considerar a importância de avaliar as condições de saúde nas mulheres acima de 50 anos, o professor Aarão lembra que estudos anteriores sobre climatério e menopausa realizados pelo grupo mostraram que são muitas as mulheres que não chegam aos 50 anos de forma saudável e apresentam várias doenças associadas. Com efeito, muitas delas revelam-se obesas, hipertensas, diabéticas e com outros males que interferem em sua qualidade de vida presente e futura, quadro preocupante quando se sabe que a população de idosos no Brasil está em crescimento. A expectativa de vida das mulheres atingiu 77,3 anos enquanto a dos homens é de 69,7 anos. Por viverem mais, elas estão mais sujeitas às doenças crônicas comumente associadas ao envelhecimento e à multimorbidade, assim nomeada a presença de duas ou mais doenças crônicas no mesmo indivíduo. Daí, diz o médico, “a importância de estudar em que condições essas mulheres estão envelhecendo em nossa população, porque o maior número de doenças leva ao uso de mais medicamentos, amplia a utilização e os gastos dos serviços de saúde, além de comprometer a qualidade de vida”. OBJETIVOS Em decorrência de menopausa em torno dos 50 anos, e diante da atual perspectiva de vida, a mulher vive cerca de 30 anos pós-menopausa e, quanto mais envelhece, mais atenção demanda. Trata-se de um problema sério revelado pelos dados obtidos que, segundo a professora Lúcia, devem servir de alerta para os gestores dos serviços de saúde pública e para os profissionais médicos, particularmente os ginecologistas que atendem a esse contingente idoso peculiar, porque, como se sabe, as mulheres vivem em média sete anos mais que os homens. O professor Aarão destaca entre os objetivos do trabalho o de chamar a atenção dos ginecologistas para o fato de a mulher poder apresentar, além das doenças nas mamas e no aparelho genital, outros males sistêmicos comuns aos dois sexos e morrer em decorrência deles e não daqueles tipicamente femininos. Ele chama a atenção para o fato de as doenças cardiovasculares constituírem principal causa de morte e por isso prega como medidas o controle da pressão arterial, do peso, estímulo à alimentação saudável, prática de atividade física frequente, campanhas antitabagismo, etc. Além da atenção com a osteoporose, que afeta grande parte das mulheres acima de 50 anos, ele alerta para a necessidade de considerar os fatores de risco que podem levar ao câncer ou a acidentes que possam decorrer de deficiências visual e auditiva. Julga que o trabalho fornece subsídios para as políticas públicas de saúde e pode servir de alerta à classe médica, em especial aos ginecologistas, e à conscientização das populações. Os pesquisadores responsáveis pelo estudo têm uma meta mais audaciosa: consideram que o ideal seria implantar medidas que permitam empurrar as doenças, já que inevitáveis, para o final da vida, de forma a garanti-la mais longa e de melhor qualidade, evitando a morte lenta. Para que isso ocorra, entendem que as ações públicas de prevenção são as melhores, apoiadas por campanhas contra o tabagismo, de combate à obesidade, de orientação para alimentação saudável e de incentivo às atividades físicas. O ideal a ser perseguido é uma vida longa e boa, acometida pelas doenças no seu final, quando se está prestes a deitar e morrer. É o que se chama compressão da morbidade. PESQUISA POPULACIONAL A pesquisadora Ana Lúcia destaca o caráter populacional do estudo, baseado em uma amostra estatística de 622 mulheres de 50 anos ou mais, entrevistadas em suas casas, que compõem um grupo representativo do universo constituído por 130 mil mulheres que compõem a população feminina acima de 50 anos da cidade de Campinas. O questionário utilizado na pesquisa e organizado por Vanessa consta de 87 perguntas, divididas em cinco grupos, que avaliam a condição socioeconômica, hábitos de saúde, percepção da mulher em relação à própria saúde, capacidade funcional e doenças crônicas propriamente ditas, entre as quais, hipertensão, infarto do miocárdio, derrame, diabetes, artrose, osteoporose, catarata, glaucoma, incontinência urinária, câncer, problemas pulmonares, particularmente enfisema, que são as mais prevalentes nessa população. O doutorado de Vanessa, realizado por meio do programa de pós-graduação da FCM, deve ser concluído este ano. Ela esclarece que, com o estudo populacional, procurou-se avaliar as doenças relacionadas ao envelhecimento em mulheres residentes em Campinas. A cidade foi dividida em setores, devidamente mapeados, de acordo com o censo de 2000, sendo selecionadas, por sorteio, áreas aleatórias em que foram localizadas as mulheres objeto do estudo, de forma a contemplar todos os extratos sociais. O trabalho de aplicação dos questionários foi coordenado pelo Cemicamp (Centro de Pesquisas das Doenças Materno-Infantis de Campinas), que utilizou assistentes de pesquisa devidamente orientadas e treinadas. RESULTADOS O aumento da prevalência das multimorbidades – duas ou mais doenças – nas mulheres acima de 50 anos pode ser explicado pela maior vulnerabilidade e maior tempo de exposição aos fatores de risco para doenças crônicas. Outro importante fator associado às morbidades no envelhecimento é o excesso de peso na juventude ou na maturidade, cuja incidência vem aumentando nos últimos anos. Mesmo o excesso de peso que se inicia na juventude está relacionado ao aumento da prevalência de numerosas doenças como câncer, diabetes, hipertensão, osteoartrite e males cardiovasculares. Cerca de 63% das entrevistadas apresentavam sobrepeso ou obesidade e 13% relataram sobrepeso ou obesidade entre os 20 e 30 anos, o que faz Ana Lúcia afirmar que estes são os fatores mais significativos em relação à presença de multimorbidades. Vanessa acrescenta que, quando se considera o Índice de Massa Corpórea (IMC), observa-se que cada unidade além do recomendado na mulher de mais de 50 anos aumenta o risco de duas ou mais doenças crônicas em 3%, o que a leva a concluir que “o envelhecimento é inevitável, mas envelhecer com o peso adequado diminui a chance de doenças”. Os dados mostram que apenas 15% das entrevistadas não referiram doenças, 26% mencionaram uma e 58% duas ou mais (multimorbidades). Foram referidas pelas entrevistadas, indicadas em porcentagens aproximadas, hipertensão (56%), osteoartrite (34%), catarata (25%), diabetes (23%). Osteoporose (21%), glaucoma (10%), bronquite (9%), incontinência urinária (9%%), câncer (7,0%), infarto do miocárdio (5%), derrame cerebral (3%) e enfisema pulmonar (2%). Notou-se, ainda, que cada ano a mais na idade aumentou a chance da presença de duas ou mais doenças em 3%, o mesmo índice observado para o aumento de cada unidade do IMC. Outros fatores associados à presença ou não de multimorbidade revelados pelo estudo foram o tabagismo, a disponibilidade de seguro médico – que facilita o acesso ao controle da saúde e a diagnósticos, e a ocorrência do período de pós-menopausa – em consequência da deficiência hormonal nas condições de saúde. |
Fonte: Jornal da Unicamp
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