Carlos Siqueira
Presidente Nacional do Partido Socialista Brasileiro – PSB
O país e suas instituições assistiram na noite de ontem, perplexos, manifestações do senhor presidente da República acerca da pandemia causada pelo coronavírus. Sobressai de forma inequívoca, no discurso presidencial, a mais brutal indiferença pelos brasileiros mais vulneráveis à infecção, entre os quais se incluem idosos, acometidos por doenças crônicas cardíacas e pulmonares e diabéticas.
Deve-se destacar, ainda, a completa ausência de empatia pelo sofrimento alheio, em benefício de uma defesa fantasiosa da preservação da atividade econômica, como se ela pudesse ser mantida nos trilhos, apesar do quadro sanitário extremamente grave pelo qual passa o planeta.
Há no discurso presidencial, somadas a indiferença pelos mais frágeis e a redução do sujeito humano a mera peça do processo produtivo, uma flagrante vertente eugenista (*), que de resto marca historicamente os posicionamentos da extrema direita, que não raro conduzem ao extermínio.
O senhor presidente faz, portanto, o que sabe fazer: transforma a inépcia e inapetência para governar, em crise política, em material para que as milícias digitais que fazem sua linha de frente, possam atacar aqueles que se mantenham nos limites do razoável.
Não por acaso, liderando um governo confuso e incapaz de compreender o quadro que a humanidade enfrenta – com honrosas exceções –, intensificam-se os ataques aos governadores e prefeitos, que demonstram acima de tudo serem sujeitos humanos sensíveis, ao transformarem suas administrações em máquinas de guerra, em defesa dos mais vulneráveis e da sanidade de seus estados e cidade.
Eles simplesmente exercem na atividade política o que há de mais relevante: preservar vidas humanas, quaisquer que sejam elas; não cair na barbárie de escolher entre os que devem sobreviver e os que devem ser deixados à morte, como se estivéssemos diante de um processo de seleção natural.
Se a pandemia, a bioquímica do vírus podem ser considerados, ainda que em caráter provisório, um fenômeno natural, o modo de enfrentá-lo é um fenômeno estritamente político, porque requer a sabedoria de fazer escolhas justas, preservar o bem comum, instituir um ambiente de solidariedade, respeito; fazer com que todos se encontrem com a compaixão que devem a seus próximos.
Essas metas, contudo, passam longe da perspectiva presidencial, que preferiria deixar à crise sanitária “cuidar de si mesma”, com os efeitos que já se viu à exaustão pelo mundo. Daí, talvez, o completo desprezo presidencial pelos atos de governo, no sentido mais elevado do termo. A perspectiva delirante que anima seu campo político rejeita a laicidade, para abraçar uma visão apocalíptica, na qual “os justos serão salvos”.
É preciso reconhecer, contudo, no contexto dos desatinos em que gravita o presidente da República, que ele foi sobrepassado pelos fatos e já aparece à população, como aquilo que de fato é: um político que jamais deixará suas bizarrices, para se tornar um estadista.
Finalmente, a fala presidencial para além da ameaça à saúde pública, aprofunda a crise política e institucional podendo gerar graves consequências negativas para o nosso país.