Autor: Lídice da Mata (PSB-BA)
Deputada federal
Nas últimas semanas foram notícia os ataques realizados pelo grupo rebelde Houthis às refinarias da Arábia Saudita. O impacto imediato foi a elevação do preço do barril de petróleo, o que fez parte dos analistas e da própria Petrobras exaltarem a atual estratégia da companhia de concentrar seus investimentos somente no Pré-Sal. Outros especialistas ainda ressaltaram os possíveis impactos sobre os preços da gasolina e do diesel no Brasil, uma vez que o correto seria a Petrobras elevar seus preços para evitar prejuízos nas áreas de refino e distribuição.
Os analistas, no entanto, omitem a capacidade que atualmente tem a Petrobras, enquanto empresa pública, para amenizar possíveis impactos prejudiciais à sociedade brasileira. Uma forma de entender isso é imaginar se a Petrobras e suas refinarias fossem privadas. O que aconteceria?
Antes de tudo, os preços da gasolina e do diesel teriam disparado no País, acompanhando a cotação do barril internacional. Somente em um dia, os preços internacionais do petróleo subiram quase 20%. Qualquer empresa privada teria aproveitado esse cenário para elevar os preços nessa proporção. Todavia, a Petrobras segurou o ajuste por entender que se tratava de um reflexo da grande incerteza sobre o futuro da produção árabe. Como resultado, a Petrobras aumentou o preço do diesel em 4,2% e o da gasolina em 3,5%, bem abaixo da disparada do preço internacional.
Aqui, é importante lembrar também que, no caso de uma empresa privada sem produção própria de petróleo, a capacidade de resistir ao aumento dos preços internacionais é muito menor. Ou seja, nesse tipo de refinaria, o custo da matéria-prima (o petróleo) equivale aos preços de aquisição internacional, enquanto na Petrobras esse custo se refere às despesas associadas à extração do petróleo.
Segundo cálculos do Ineep – Instituto de Pesquisa do Setor de Petróleo, a diferença entre o custo internacional e o de extração da Petrobras, em 2019, oscilou entre R$ 20 e R$ 30 para cada barril. Além de ser mais barato, o custo da Petrobras não sofre esse tipo de oscilação do mercado internacional. Se a Refinaria Landulpho Alves (RLAM) fosse privada, por exemplo, os donos da refinaria comprariam o petróleo a preços internacionais e, obrigatoriamente, teriam de repassá-lo ao consumidor para não sofrerem prejuízo. No caso dessa semana, por exemplo, seria muito provável que o preço da gasolina e o diesel teriam aumentado em torno de 20%.
Outro aspecto que poucos analistas comentam está num possível impacto para arrecadação fiscal de alguns municípios. A legislação brasileira do setor garante que municípios com instalações logísticas tenham direito a uma parcela dos royalties do petróleo produzido no Brasil. Com efeito, quando há o transporte do petróleo cru produzido no Brasil para a RLAM, os municípios “afetados” por esse transporte têm direito a essa parcela dos royalties. Todavia, caso a RLAM seja privatizada e a nova empresa opte por adquirir petróleo estrangeiro, tais municípios deixarão de receber esses royalties, uma vez que as taxas pagas no petróleo estrangeiro ficam no seu país de origem.
Em resumo, a privatização significará incerteza de preços para o consumidor e arrecadação para alguns municípios. Isso interessa à sociedade?
* Artigo originalmente publicado no jornal A Tarde em 2/10/2019