Proprietária conseguiu recuperar floresta nativa após dez anos em busca de apoio.
“Por que você fez isso? Por que não plantou eucalipto?” Intrigados, conhecidos de Osmarina Donizete da Cunha Benedito (na foto, ao lado do marido Acácio José Benedito), 52 anos, queriam entender a escolha dela em plantar árvores nativas de Mata Atlântica em quatro hectares no seu sítio em Joanópolis (SP), município localizado da Serra da Mantiqueira. A preocupação dela era preservar dez nascentes. Para isso, por uma década buscou ajuda financeira. Osmarina nasceu no Sítio Santo Antônio, localizado na encosta de um vale. Ela herdou a terra do pai há 17 anos, que por sua vez, ficou com a área após o falecimento dos avós e bisavós. Estes eram fazendeiros de café, inclusive proprietários de escravos no passado. Quando Osmarina era criança, sua família cultivava no local árvores frutíferas, milho, feijão e arroz para subsistência. Também tinha vaca para retirar o leite e fazer queijo. O local que recebeu as 6.664 árvores nativas pertencia a um dos irmãos da proprietária (eles são em três filhos) e ela uniu a sua área. “Troquei com ele por um lote que eu tinha na cidade. A maioria das nascentes está lá, meu medo era de que alguém estranho comprasse o local, plantasse eucalipto e acabasse com a água”, explica. Um engenheiro apontou dez nascentes no sítio da Osmarina. “Com o tempo, percebi que estavam sumindo. Até que veio a estiagem de 2004 e sobraram apenas duas”, relata. “Como vai ser daqui há dez anos? O brasileiro só dá valor quando perde, infelizmente”, completa. O solo começou a se degradar mais por conta da pastagem. Na região do sítio, quando ela era criançca haviam florestas intactas e chácaras. “A floresta atrai a fauna e dá alimento para os bichos. No meio das árvores nativas plantadas, nascem outras espécies nativas”, explica Osmarina. Hoje, há muita braquiária (espécie de capim) e casas de veraneio na região. “Sempre gostei de mata. Não tenho interesse em criar boi e nem em vender a terra. Quero preservar”, diz. “Já me chamaram de louca, mas as pessoas estão muito consumistas e materialistas. Só querem coisas que dão dinheiro como eucalipto. Antigamente, um vizinho ajudava o outro no cuidado da terra. Hoje em dia não se tem mais isso”, lembra. Em 2011, ela deixou de vez sua residência na propriedade rural onde vivia com o único filho de 31 anos e o marido e passou a morar na cidade. Além de cuidar da terra, no sítio ela trabalhava como costureira. Hoje, é ajudante operacional na escola estadual Vicente Camargo Fonseca. “Tudo o que você encontra no mercado, embora esteja em embalagem bonitinha, vem da Zona Rural. Se alguém não trabalhar lá, não teremos o que comprar. O produtor rural deveria ter valor”, ressalta. “O pior é que ninguém mais quer plantar. E aí, vamos fazer como?”, completa. Para ela, o produtor rural sofre injustiças. Quando produzia leite, vendia por 50 centavos o litro e a cooperativa revendia por R$ 1,5. “A gente levantava de madrugada com chuva, sol, geada, tinha que comprar remédio para as vacas, limpar o curral, era muito cansativo”, revela. Mesmo tendo mudado o local de residência, Osmarina queria recuperar o sítio, mas não tinha condições financeiras. “Em 2005, comecei a entrar em contato com a Secretaria do Meio Ambiente da cidade, com a Casa da Agricultura, mas não tive esse apoio”, conta. Ela plantou as mudas que conseguia de doação, mas não eram suficientes e nem tinha adubo e outros recursos para cuidar dessas plantas. Osmarina participava com frequência de reuniões nessas e em outras instituições até que resolveu fazer um curso de pastagem ainda em busca de auxílio. Durante o curso, o professor pediu que os alunos escrevessem o porquê do interesse na aula. “Anotei que cursava com o intuito de reflorestar o sítio. No final dele, o professor me chamou e disse que achou interessante. Passou o contato do Pedro Matarazzo, da Da Serra Reflorestamento”, fala Osmarina. Na época, a Iniciativa Verde havia contatado a empresa especializada em recuperação florestal em busca de área para plantar árvores nativas. A parceria entre a propriedade de Osmarina, a Da Serra Reflorestamento e a Iniciativa Verde deu certo. A Iniciativa Verde inscreveu a terra dela disponível para recuperação florestal na prateleira de projetos do Programa Nascentes, da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. Em seguida, a Concessionária Move São Paulo, responsável pela construção da Linha 6 – Laranja do Metrô, pagou a recomposição da área como compensação ambiental. As árvores foram plantadas em 2015 (ao lado, foto tirada em fevereiro de 2016 de parte da área recuperada). Logo os resultados apareceram e surpreenderam a proprietária: “Nossa, como aumentou a água da nascente neste um ano. Já está até fazendo barulho. Tem uma bica de água!”, diz contente. Seu marido, que atualmente é pedreiro na prefeitura da cidade, ficou receoso quando há dez anos ela contou sobre sua intenção de recuperar a área. “Nós sempre concordamos em tudo, mas ele queria criar gado”, diz Osmarina. Ela argumentou que gado não compensa financeiramente se comparado ao esforço em se manter a criação. E ele concordou. Seu filho Jéferson, que trabalha em escritório, aprovou totalmente a ideia da mãe. “Para mim era importante ele apoiar. É meu único herdeiro e gosta de preservar”, alegra-se. “Eu não plantei por obrigação, fiz por livre e espontânea vontade”, ressalta Osmarina. “Quem tiver intenção de reflorestar seu sítio, não desista. Tenha fé. Eu lutei dez anos e consegui”, completa. Para ela foi um sonho realizado. “E quando você vê concluído aquilo que você sonhou?”, finaliza. Sobre este plantio A manutenção do plantio e mais dados sobre ele podem ser acompanhados por meio deste link. Série protagonismo feminino no campo Durante estes dez anos de vida, a Inciativa Verde tem notado o protagonismo feminino no campo. Em diversos locais, as líderes comunitárias são mulheres. Em várias propriedades rurais, as mulheres são responsáveis pela administração da casa e da terra. De acordo com a publicação “Estatísticas de Gênero – Uma análise dos resultados do Censo Demográfico 2010”, lançada em 2014 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), elas são responsáveis por quase 40% das famílias brasileiras, mas recebem cerca de 3/4 de rendimento médio se comparadas aos homens mesmo estudando mais. Além disso, a taxa de atividade feminina (de mulheres trabalhando ou procurando trabalho) é maior entre as urbanas, 56%, frente a 45,5% das mulheres rurais. Isso indica uma subnotificação das atividades e uma representação de que a produção para autoconsumo é desconsiderada trabalho. Entre as pessoas sem rendimento, o maior peso estava entre as mulheres de áreas rurais (32,3%) frente a 23,9% de urbanas. Sabendo dessas desigualdades, a Iniciativa Verde inaugurou esta série que vai mostrar algumas histórias inspiradoras de mulheres que transformam a vida no campo. E, principalmente, por meio da recuperação das nossas florestas ajudando a melhorar a qualidade de vida de toda a sociedade. Por Isis Nóbile Diniz |
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Fonte: Iniciativa Verde
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