Os brasileiros estão muito longe de dividir as tarefas domésticas. E suas ideias refletem a desigualdade de gênero no âmbito familiar
Hoje no Brasil as mulheres representam 43% da força de trabalho formal. Seu ingresso no mercado de trabalho remunerado aumenta ano a ano. Quase não muda, no entanto, na divisão do trabalho doméstico em família: elas continuam trabalhando muito mais em casa do que os homens. E essa atividade não remunerada ainda é vista, com frequência, como algo essencialmente feminino.
Os dados são do relatório “Situação da Paternidade no Brasil!” do Instituto Promundo, que reúne indicadores sobre a divisão de trabalho e cuidados com os filhos e com a casa no país.
“Os homens vêm assumindo um papel mais ativo no âmbito doméstico, principalmente em relação aos filhos, mas a principal responsabilidade ainda é das mulheres na maior parte das famílias”
Alessandra Rachid
doutora em engenharia que pesquisa organização do trabalho na UFSCar
A situação brasileira não é diferente do resto do mundo. O trabalho doméstico não remunerado – ou seja, aquele feito na própria casa – ainda é visto como um “problema de mulheres”.
Mas delegar essas tarefas exclusivamente ao sexo feminino, diz o relatório, afeta não apenas as mulheres e a conquista da igualdade de gênero, como também as crianças, os homens e a economia dos países.
1.Mulheres gastam mais horas em cuidados com a casa e filhos
Segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), mulheres com filhos dedicam, em média, 25,9 horas semanais a cuidados com a casa. Homens com filhos dedicam apenas 15,5 horas. Os dados são da pesquisa “Mulher e trabalho: avanços e continuidades”, de 2010. No mundo, a situação se repete. Segundo levantamento feito pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), mulheres gastam por dia 2 horas e meia com filhos e tarefas domésticas. Homens, 1 hora e 20 minutos.
2.Menos da metade dos homens se dedica a tarefas domésticas
No Brasil, 46% dos homens adultos realizam trabalho doméstico. Entre as mulheres, esse número é de 88%. Dados da OCDE mostram que, quanto maior a renda média de um país, menor é essa desigualdade na divisão de trabalho.
3.A situação não tem mudado nos últimos anos
Entre 2001 e 2011, os homens aumentaram sua participação nos cuidados domésticos em apenas 8 minutos. No mesmo período, a quantidade de horas trabalhadas em atividades não remuneradas caiu entre as mulheres: foi de 24 horas para 22 horas semanais.
4.A percepção de cuidados é diferente entre homens e mulheres
Uma pesquisa do Instituto Promundo feita no Rio de Janeiro buscou qualificar o tipo de trabalho doméstico realizado entre os homens. Quando eles responderam a pesquisa, disseram trabalhar realizando consertos na casa (88%), pagam as contas (76%), fazendo comida (45%), lavando roupas (45%) e cuidando dos filhos (39%).
Na mesma pesquisa, entretanto, quando as respostas dos homens eram confrontadas com a das mulheres, os resultados eram diferentes. Apenas 10% das mulheres relataram que os homens participavam do cuidado com os filhos, 14% que lavam roupa e 13% que fazem comida. Em relação ao cuidado com os filhos, segundo as mulheres, a principal atividade desempenhada pelos homens é “brincar” (72%), seguida por “trocar fraldas” (42%).
5.Na visão dos homens, tarefas domésticas ainda são femininas
No relatório, o Instituto Promundo reuniu resultados de pesquisas que buscaram mensurar a percepção dos homens sobre os trabalhos domésticos. Entre esses resultados:
54% dos homens concordam totalmente com a afirmação que “O papel mais importante da mulher é cuidar da casa e cozinhar para a sua família”
89% consideram “Inaceita?vel que a mulher na?o mantenha a casa em ordem”
53% acreditam que “A mulher é a principal responsável por manter um bom casamento”
43% concordam que “O homem pode até ajudar, mas quem deve ser responsável por cuidar da casa é a mulher”
63,8% concordam totalmente ou parcialmente que “Os homens devem ser a cabeça da casa”
Fontes: Instituo Avon/Data Popular (2013), IPEA (2013), Barker y Aguayo (2012)
Como reverter a situação
Dois fatores contribuem para manutenção da desigual divisão sexual do trabalho não remunerado. Eles estão relacionados à políticas de assistência de empresas e dos governos. Quando as políticas públicas trabalhistas – licenças, por exemplo – se focam apenas nas mães, reforçam o papel feminino na divisão de cuidados e tarefas domésticas.
No Brasil, os homens têm direito a apenas cinco dias de licença após o nascimento de um filho, o que limita a sua participação nos cuidados da criança. Além disso, há o estereótipo do trabalhador sem vida pessoal, normalmente associado à masculinidade. Uma pesquisa do Instituto Promundo mostrou que entre 61% e 77% dos pais relataram que trabalhariam menos se isso significasse que eles poderiam passar mais tempo com seus filhos.
Jornada de trabalho mais flexível e licenças parentais igualitárias podem ser ferramentas para reduzir essa desigualdade.
Tatiana Dias
Fonte: NEXO