Nos últimos oito anos, houve um enorme crescimento nas denúncias de violência doméstica. Números mostram que, de 2006, quando a Lei Maria da Penha entrou em vigor, até este ano, as ocorrências saltaram de 113 para mais de 5,6 mil, ou seja, um aumento de quase 5.000%. Este levantamento foi realizado pelo Núcleo de Gênero Pró-mulher do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT). O objetivo do levantamento foi prestar contas à população sobre o trabalho do Ministério Público, além de disponibilizar informações das ações que o órgão promove. Segundo o promotor de Justiça e coordenador do Núcleo de Gênero Pró-mulher Thiago Pierobom, não existem elementos para afirmar que o número de casos de Violência Contra a mulher aumentou nos últimos anos. “O que houve foi um aumento nas denúncias. Para afirmamos que houve uma aumento na violência, teríamos que realizar uma entrevista com cada vítima.” A Lei define o conceito de violência doméstica e familiar contra a mulher como “[…] qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial” (art. 5o). A professora do Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília (UnB) Gláucia Diniz explica que o aumento nas denúncias pode ser ocasionado tanto pelo maior acesso às informações das leis para as mulheres, como também por causa do aumento da violência doméstica. “As políticas públicas voltadas para as mulheres têm crescido, a informação tem um papel fundamental”. Para ela, que também é membro do Núcleo de Estudo e Pesquisa da mulher (Nepem), este é um processo de feminismo que vem dos anos 60. “Com as mudanças, houve um somatório que expôs ou abriu os casos de família, pois o caso de violência é no ceio familiar, quase ninguém ficava sabendo”. Para a secretária da mulher do Distrito Federal, Valesca Leão, o aumento do número de denúncias se deuporque as mulheres estão se sentindo mais seguras. “O DF é referência nacional no enfrentamento à Violência Contra a mulher e a criação de políticas públicas para tratar o assunto é um dos motivos desse salto no número de deníncias.” Valesca pontua que a expectativa é que o número de denúncias aumente ainda mais. Sem um perfil traçado A pesquisa não levantou um perfil para o agressor ou para vítima. Segundo o promotor de justiça Thiago Pierobom, o perfil dos envolvidos é indefinido. “Costumamos dizer que a violência doméstica é perversamente democrática, ou seja, atinge todas as classes sociais”, destacou. Para a psicóloga Gláucia Diniz, qualquer pessoa pode ser violenta. “Existe uma tendência do homem agressor ter uma posição mais firme com relação ao gênero”, pontuou, ponderando que não chega a ser uma característica para todos os agressores. Estudos realizados em outros estados do País apontam outra realidade. Um levantamento feito em 2011, pelo governo do Rio Grande do Sul apurou que, entre as mulheres vítimas de agressão, a maior parte está na faixa acima de 40 anos, são pardas e, principalmente, de baixa extração social, baixo rendimento, baixa escolarização e inserção precária no mercado de trabalho. No caso do agressor, a média de idade é a mesma e o uso de substância, em especial o álcool, por parte dos homens em situação de agressão, esteve associado em 39,4% dos casos. Mudança de comportamento Para Pierobom, desde o início, a Lei Maria da Penha tem informado as mulheres sobre as necessidade de denunciar. “Houve uma mudança grande na cultura no Brasil. As mulheres estão mais dispostas a denunciar”. O promotor ressalta ainda que há subnotificação, pois as vítimas não costumam procurar as autoridades na primeira agressão. A gerente comercial Patrícia (nome fictício) sofreu agressões do companheiro durante dois anos. Ela conta que, quando o conheceu, tudo parecia perfeito. “No começo, era um namoro muito tranquilo, um homem estabilizado emocional e financeiramente e que tinha o perfil de esposo que toda mulher sonha. Mas logo que fomos morar juntos percebi que ele era ciumento e agressivo”, detalha. Segundo a vítima, logo na primeira discussão houve agressões verbais e o primeiro empurrão. No entanto, ela preferiu acreditar que era apenas um deslize causado pelo nervosismo. “Ele me humilhou e me senti muito desvalorizada, disse que eu era feia e isso doeu muito. Na segunda briga, ele puxou meus cabelos e me jogou contra a parede. Foi aí que vi que tudo estava errado”, conta. Patrícia, que tem um a filha de outro relacionamento, diz que foi preciso ser ameaçada de morte para decidir denunciá-lo. “Sempre depois das agressões ele se ajoelhava e pedia perdão, dizia que a culpa era minha porque eu o desafiava, até que um dia ele me disse que havia pessoas que dependiam de mim e que eu tomasse muito cuidado porque ele iria me matar. Foi nesse dia que esperei ele ir para o trabalho peguei minha filha e fugi, tive a certeza que se eu continuasse com ele eu perderia minha vida”, completou. Atualmente, o DF possui cerca de 19 juizados especializados para analisar casos de violência domésticas e 40 promotorias para atender a demanda do DF. Além disso, o DF possui um Núcleo de Gênero do MPDFT, que também aborda o tema, a Delegacia Especializada no Atendimento à mulher (DEAM) e uma Secretaria da mulher. OS CRIMES De acordo com o promotor de justiça Pierobom, os quatro crimes mais tipificados nas denúncias são lesão corporal, vias de fato, ameaças e injúrias. “Lógico que existem outros, como tortura, cárcere privado e estupro contra a vontade, por exemplo. Esses são menos denunciados pois ainda existe um tabu a ser quebrado”. O DF possui vários órgãos para atendimento de vítimas feminicídio O feminicídio é o homicídio praticado contra mulher por razões de gênero, é a violência fatal que, na maioria das vezes, é causada por seus companheiros. Segundo um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), cerca de 50 mil feminicídios ocorreram no Brasil entre 2001 e 2011, aproximadamente cinco mil mortes por ano. O estudo constatou também que não houve redução do número de homicídios contra a mulher, após da criação da Lei Maria da Penha em 2006. mulheres na faixa etária de 20 a 39 anos, negras e com baixa escolaridade são as principais vítimas desse tipo de crime no país. O Espírito Santo é a região com maior taxa de vítimas neste tipo de crime, 11,24 em cada 100 mulheres, seguida da Bahia com 9,08. O Distrito Federal está na 19° posição, com 5,53. No dia (2) deste mês foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado federal o PLS 292/2013, que tipifica o feminicídio como crime, com pena de 12 a 30 anos de prisão. A tipificação especial para o feminicídio, que não elimina punições por outros crimes como agressão e estupro, foi recomendada pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Violência Contra a mulher. |
Fonte: Alagoas 24 horas
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